Vivo no Irã e quero desmentir alguns mitos sobre este país

Lugares
há 1 ano

Olá! Meu nome é Cristina, tenho 25 anos e há 5 conheci um iraniano. Nos apaixonamos e hoje eu vivo neste que é um dos países mais misteriosos do mundo: o Irã. Para quem vive no ocidente, a vida aqui é cheia de mitos. Hoje, vou contar para vocês o que é verdade e o que é mentira nessa história.

Especialmente para os leitores do Incrível.club, procurei desconstruir alguns dos mitos mais populares sobre este país, e aproveitei para compartilhar alguns dados que vão abrir a sua cabeça para um lado desconhecido sobre o Irã.

Mito 1: as mulheres iranianas se vestem de preto dos pés à cabeça

Depois da Revolução iraniana de 1979, quando o regime islâmico se instalou, um código realmente rígido foi introduzido para as mulheres: elas estão proibidas de mostrar as pernas, as mangas devem ser no mínimo do tipo 3/4 e elas não podem usar roupas justas e que mostrem o busto. E o mais importante: toda mulher deve usar um véu.

Mas em nenhum momento eu vi uma mulher em burka, a roupa que cobre completamente deixando apenas os olhos descobertos e é, portanto, um código de vestuário bem mais rígido. As iranianas mais religiosas, em geral as mais velhas, podem ser vistas em xador, uma roupa preta que esconde todo o corpo e deixa apenas o rosto descoberto.

O véu é um código imposto por lei, ainda que nem todas as pessoas jovens no país sejam realigiosas. Calça jeans, sandálias, salto alto e roupas da moda não estão proibidas, por isso as mulheres estão sempre muito bem vestidas. O véu frequentemente é usado como um acessório de moda e costuma ser colocado sobre a cabeça; ele não é enrolado.

No Irã existe uma ’polícia da moda’. Os fiscais dessas regars ficam em lugares onde os turistas costumam frequentar e pegam os infratores. Nesses casos, os turistas precisam seguir as normas, já os locais podem precisar pagar uma multa.

Nem todos os iranianos estão felizes com o código do país: assim que o avião alcança uma determinada altura, muitas mulheres trocam de roupa e decidem andar sem véu. Ou seja, o assunto não envolve apenas religião, mas tem a ver com a legislação e que precisa ser respeitado. Mas, de qualquer forma, a maioria das mulheres se veste muito bem.

Mito 2: as mulheres não têm direitos

As mulheres vivem com um pouco mais de liberdade do que em outros países muçulmanos. A mulher iraniana tem o direito de ser quem ela quiser. Eu já vi mulheres policiais, tradutoras e jornalistas. As mulheres iranianas podem sair na rua sozinhas, andar de taxi, elas se sentam na mesa com os homens e uma grande quantidade de funcionários em diferentes tipos de estabelecimentos são mulheres.

Além disso, a chefe da família costuma ser a mulher. É ela quem se encarrega da administração dos gastos familiares. Muitas casas têm empregada doméstica, portanto as mulheres não precisam ocupar o papel de dona de casa todos os dias da semana. Elas têm o direito de pedir o divórcio e de dirigir. As mulheres iranianas são muito sociáveis e abertas, conversam tranquilamente com homens desconhecidos no mercado, gostam dos turistas e não têm problema nenhum em serem fotografadas.

Mito 3: o Irã é um lugar muito perigoso

A reputação do Irã está bastante manchada principalmente por causa da difícil relação com os Estados Unidos e das sanções impostas. Em primeiro lugar, é melhor adiantar que no Irã não há conflitos armados. Além disso, existe um indicador chamado ’índice global de terrorismo’, responsável por medir a quantidade de atos terroristas, vítimas e outros problemas. Os primeiros lugares são ocupados pelo Iraque, Afeganistão, Nigéria e Síria. O México está na posição 44, os Estados Unidos na posição 32, a Rússia na 33 e a Alemanha na posição 38. O Irã, segundo os dados desta classificação, está no lugar 53. Muitas pessoas costumam confundir Irã e Iraque, e por isso têm tanto medo deste país.

Em função das restrições, não é possível encontrar muitas marcas famosas no país, nem comida do tipo fast food. Além disso, o Facebook e algumas outras redes sociais não funcionam.

Mito 4: os noivos se conhecem apenas no dia do casamento

Isso depende muito da família. Sim, no Irã existem famílias que seguem com muita rigidez as leis do Alcorão (o livro sagrado). Nelas, é comum os pais proibirem seus filhos de terem relações sexuais antes do casamento, e eles escolhem a pessoa com quem as filhas vão se casar, portanto não deixam tempo para que os casais se conheçam antes. Mas isso acontece em um grupo minoritário.

A maioria dos iranianos jovens não se escondem: eles têm namorados e andam de mãos dadas. Por outro lado, é proibido se beijar na boca na frente das outras pessoas, ou mostrar os sentimentos em público, mas ninguém vai preso por dar um beijo na bochecha de outra pessoa.

Para começar a viver junto, o casal precisa fazer um nikah (casamento) temporário: ele é realizado rapidamente e sua duração pode variar. No Irã, é costume comemorar os casamentos, mas nem todo mundo tem dinheiro para organizar uma festa. Os jovens vivem juntos (nikah), economizam e assim ninguém olha para eles com preconceito.

Frequentemente os casais celebram um contrato matrimonial, e ele possui um componente curioso: o mahrieh. Nada mais é que um presente em dinheiro dado pelo noivo para a noiva que ela pode gastar como ela desejar. O mahrieh também pode ser dado como moedas de ouro ou até mesmo algo mais criativo, como 500 mil rosas, uma coleção de poemas escritos à mão e por aí vai.

Agora que alguns mitos foram desmentidos, quero contar algumas peculiaridades que me surpreenderam no Irã.

1. A rinoplastia é muito popular

Muito provavelmente o Irã ocupa o primeiro lugar em operações no nariz. Quase uma em cada duas mulheres iranianas possui um ’novo nariz’. Você vê mulheres em farmácias e até mesmo nas ruas andando com curativos no nariz o que mostra que isso é realmente comum. As mulheres não escondem que fizeram uma operação. Na verdade, é uma maneira que elas têm de mostrar que a sua família tem dinheiro para pagar o procedimento. O mais divertido é que algumas simplesmente colam curativos para parecerem ricas.

E isso não significa que o nariz da mulher iraniana seja muito grade, trata-se apenas de moda. Uma moda bem estranha...

2. O Irã tem a sua própria comida de rua, e ela é muito original

Em relação à comida de rua, não encontramos apenas sanduíches e hot dogs; no Irã é possível experimentar um quitute de beterraba, batatas no forno e até mesmo feijão frito. Os vendedores ficam na rua e preparam a comida em panelas quentes.

Por outro lado, as pessoas adoram e sabem cozinhar muito bem. Os iranianos adoram receber visitas e servem uma mesa repleta de iguarias locais. Quando eu me mudei para cá, quase sempre visitava amigos e familiares do meu marido. As mesas sempre estavam cheias de pratos. Além disso, eu sempre recebia presentes. E mais um detalhe: aqui as pessoas tomam chá 24 horas por dia.

3. As entradas dos prédios parecem entradas de hotel, e os apartamentos parecem salas de museu

No Irã, assim como no mundo todo, existem diferentes tipos de casas, das mais simples às mais luxuosas. Mas o que impacta são os apartamentos da classe média, à qual meus sogros pertencem. Nos bairros ricos o que mais impressiona é que nada está fora do lugar, é tudo perfeito.

A minha cunhada vive em um bairro novo. O local conta com uma boa infraestrutura, parquinho para crianças, escolas e lojas. Há 3 shoppings, um monte de restaurantes e parques.

As entradas para os centros habitacionais merecem um comentário especial. Tudo depende se ele é ou não é novo. Nos novos, existem recepções, segurança e uma bela sala de entrada. Alguns prédios vão mais além e possuem televisão e aquários, e sempre há música nos elevadores. Você entra no elevador, escolhe o andar e imediatamente a iluminação é trocada e começa a tocar uma música da trilha sonora de Kill Bill, filme de Tarantino.

Se na entrada dos prédios há tanta beleza, imaginem dentro dos apartamentos. O estilo iraniano é puramente luxuoso: decoração com ouro, formas redondas e muito vermelho. Para os iranianos o principal valor é a família, por isso eles querem sempre deixar a casa o mais cômoda e acolhedora possível. Todos os detalhes são sempre muito bem pensados. Em cada apartamento, até mesmo no menor deles, sempre há uma sala cômoda com sofá e mesa. Isso acontece porque, como mencionei anteriormente, as casas sempre estão cheias de convidados, e os tamanhos dos apartamentos permitem isso. Um imóvel de 100 metros quadrados não é algo extremo, é algo normal.

As casas sempre estão limpas, e mesmo com crianças comendo o tempo todo, é quase impossível achar restos de sujeira.

Algumas vezes eu observei como a minha sogra se prepara para receber convidados na sua casa. Ela passa o aspirador de pó de um jeito que parece que a fibra vai se desfazer. Na cozinha, tudo sempre está limpo, até mesmo o rodapé atrás da geladeira. Os iranianos adoram tapetes (e os tapetes persas são famosos no mundo inteiro). E, claro, um tapete costuma ser o indicador de riqueza de uma família. Os tapetes feitos à mão custam muito dinheiro e até mesmo os apartamentos pequenos e simples têm um, ainda que seja de uma fábrica.

4. As ideias arquitetônicas interessantes estão em toda parte

Uma das coisas que mais me surpreenderam foram os edifícios super diferentes. Em Teerã, capital do país, há uma enorme quantidade de jovens arquitetos e eles fazem obras incríveis. Um bom exemplo é a ponte para pedestres Tabiat, de 270 metros (na primeira foto), que foi desenhada por uma mulher de 26 anos.

As fachadas de granito e as fachadas de vidro e de madeira também são um espetáculo. Claro que nem tudo é de bom gosto, mas, em geral, as ideias são muito inovadoras e interessantes.

E mais algumas observações...

  • No Irã, as pessoas frequentemente fazem barulhos com a língua. Essa é a maneira que eles têm de dizer ’não’. Os iranianos vão fazer barulho com a língua se eles querem recusar um convite para tomar um chá, por exemplo. Uma criança que não quer ir para a escola também vai fazer barulhos com a língua. As pessoas nos mercados fazem o mesmo quando alguém tenta pechinchar. Isso é algo habitual e é fácil de se acostumar. Quando você menos esperar, estará fazendo o mesmo.
  • É muito comum ver homens se beijando na bochecha.
  • No Irã estão permitidas as operações para mudança de sexo. O governo considera que as operações podem ser realizadas se elas forem ajudar uma pessoa a se sentir bem (identidade de gênero). O Estado patrocina parcialmente as operações com mais ou menos 3 mil dólares e faz um controle total do processo, desde a primeira consulta com um psicólogo até as consultas com um cirurgião. O número de operações desse tipo no país é superado apenas pela Tailândia.

Vale a pena viajar para o Irã?

Os turistas costumam ter medo de viajar para o Irã, e tudo isso é uma consequência das desavenças com os Estados Unidos. Infelizmente, algumas pessoas associam o Irã com o vizinho Iraque, mas os países são completamente diferentes. Aqui, as pessoas são muito acolhedoras, não há guerras, é quente e seguro.

Quem eu recomendo que conheça o Irã? Pessoas que gostam de lugares pitorescos. Você não vai encontrar uma multidão de turistas e vai se sentir em um outro mundo. Na hora de ir embora, vai levar um monte de presentes, como tapetes, vasos, condimentos e chás. Vai conhecer um povo super simpático, visitar mesquitas maravilhosas, admirar o lago rosa Úrmia e saborear uma das cozinhas mais maravilhosas do mundo. Venha conhecer esse espetáculo com os seus próprios olhos!

O que você já tinha ouvido sobre este país? Ficou surpreso com essas declarações? Compartilhe a sua opinião nos comentários.

Comentários

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eu fico feliz por ter essa quebra de expectativa, mas a impressão que eu tive vendo os stories dela ou sua experiência que ela tem uma condição financeira muito superior ao de todo o país. então eu não sei se seria a mesma realidade em condições mais pobres

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