O relato de uma mãe atípica diagnosticada como autista após 28 anos e sua luta diária pelo respeito à diversidade

Gente
há 1 ano

Quando falamos sobre autismo, logo surgem na cabeça alguns estereótipos: geralmente uma criança branca do sexo masculino, de classe média e com características cognitivas bastante peculiares. Só que o autismo é uma condição muito mais ampla que esse estereótipo. Pode ocorrer com mulheres, com gente de qualquer classe social e de qualquer tom de pele. Ah, e o diagnóstico pode ser tardio; ou seja, a descoberta ser feita depois de a pessoa já ser adulta.

Ao se depararem com essas últimas características, algumas pessoas podem discriminar os autistas mais velhos por simples falta de informação. Hoje, o Incrível.club quer que você conheça o relato de Jéssica Borges, uma mãe atípica e educadora inclusiva, que aos 28 anos recebeu um diagnóstico tardio de autismo. Ela enfrenta preconceitos com o conhecimento que adquiriu sobre o assunto e luta por respeito e direitos para seu filho e outras pessoas com esse espectro.

Jéssica descobriu o autismo após se tornar mãe

Arquivo pessoal / Jéssica Borges

Desde que seu filho nasceu e foi diagnosticado como autista, Jéssica resolveu buscar informação para poder entender melhor sobre o assunto. Durante seus estudos e pesquisas, ela descobriu que 97% dos casos são genéticos. Foi quando se encorajou para seguir investigando e adquirir mais conhecimento.

Ela chegou, inclusive, a encontrar textos de perfis nas redes sociais com os quais se identificava. “Eu estudava para entender meu filho, mas comecei a desconfiar, de verdade, de mim mesma. Percebi que não estava somente no ’fenótipo ampliado’. Resolvi fazer uma terapia. Foi quando a terapeuta percebeu alguns traços autísticos. E me diagnosticou com autismo tardio”, lembrou.

O processo de autoconhecimento foi muito difícil para ela

Arquivo pessoal / Jéssica Borges

Para Jéssica, ser mulher e ter um diagnóstico tardio não foi fácil. Ela ressalta que muitos estudos científicos são feitos majoritariamente com homens — o que já exige uma quebra de padrão sobre como a sociedade enxerga uma mulher autista. Outro ponto, segundo ela, foi perceber que, justamente por conta disso, não pôde ter um diagnóstico precoce, o que a fez se sentir deslocada da sociedade em diversas situações, além de passar por um difícil processo de aceitação.

“Durante muito tempo, senti que mascarei minhas características. Quando fui diagnosticada, as memórias foram voltando. A sensação de máquina do tempo foi profunda. Levei 28 anos para descobrir realmente quem sou. Passei todo esse tempo me perguntando sobre meu verdadeiro eu”, desabafou.

Arquivo pessoal / Jéssica Borges

Segundo ela, é preciso coragem para enfrentar as pessoas que têm um estereótipo formado sobre o tema: “Quando não estamos dentro do que as pessoas esperam, esbarramos com o ’capacitismo’, o preconceito e ficamos à margem”, pontuou. “Quando falo para as pessoas que sou autista, costumam dizer que não tenho cara. Mas que cara é essa? Sempre me questiono!” Clique aqui e leia mais sobre capacitismo.

Jéssica afirma que a rigidez cognitiva — dificuldade de realizar tarefas ou ações diferentes do habitual — era uma barreira na infância. “Quando eu marcava um encontro com uma amiga e, de última hora, ela desmarcava, era complicado compreender essa mudança. Era difícil alterar aquilo que já estava preparado na minha cabeça. Ficava nervosa e ansiosa”, lembrou. Hoje ela faz terapia para melhorar esses comportamentos.

A educadora inclusiva se orgulha de ter terminado seus estudos e formado uma família

Arquivo Pessoal / Jéssica Borges

Jéssica considera um êxito toda sua trajetória até hoje. Sim, houve obstáculos, mas ela superou, como estudante e, depois, como profissional. Por exemplo: algumas faculdades não oferecem um curso apropriado para quem é diagnosticado como autista. Caso houvesse essa adaptação por parte das instituições de ensino, os estudantes com espectro autista teriam maior facilidade de lidar com as disciplinas e, assim, de concluir os cursos.

“A sociedade espera que sejamos incapazes; espera que não tenhamos a capacidade de concluir um estudo, de ter um relacionamento, de construir uma família ou de ter amizades”, fala, destacando a rotina diária que enfrenta, com família, exigências de trabalho, escola do filho e rotina de casa. Conheça, aqui, algumas expressões preconceituosas em relação ao autismo e saiba como evitá-las.

Aos 29 anos, ela é ’mãe atípica’ e ativista

Arquivo pessoal / Jéssica Borges

A expressão ’maternidade atípica’ é usada para falar sobre mães de pessoas com deficiência. Apesar de não gostar do termo (por achar que esse tipo de objetificação a coloca num pedestal), a educadora inclusiva ainda acha necessário seu uso. “Melhor do que escutar que sou guerreira apenas porque estou cuidando de um filho autista. É como se eu fosse forte por cuidar de um fardo”, comentou.

Ela avalia a maternidade atípica como uma ponte para a equidade e a inclusão. E para isso, resolveu se aprofundar na temática e conquistar espaço na sociedade. “Me vi dentro do ativismo quando precisei confrontar os meus anseios e garantir os direitos do meu filho”, disse. Hoje ela é diretora do Instituto Lagarta Vira Pupa e integrante da Associação Brasileira pelos Direitos da Pessoa Autista (Abraça).

Arquivo Pessoal / Jéssica Borges

“Não há nada mais inovador do que incluir as pessoas com deficiências”, exalta Jéssica

Arquivo Pessoal / Jéssica Borges

Para isso, segundo a ativista, é necessário buscar informação de qualidade e de fontes seguras. “Não é preciso ser uma pessoa com deficiência para estudar ou entender sobre autismo. Tudo o que faço hoje em dia de desmistificação é uma semente que planto para que a sociedade respeite a diversidade das pessoas e tenhamos um espaço com equidade”, conclui.

Depois de tantos incentivos para buscarmos informação, sermos mais inclusivos e respeitarmos as diversidades, compartilhe sua opinião sobre o assunto e não deixe de circular este texto entre seus amigos e familiares.

Vamos ajudar a plantar essa semente do conhecimento e de eliminação de estereótipos.

Comentários

Receber notificações

Muito bom ler relatos assim! Gratificante! Parabéns pela matéria! Parabéns a todas as mulheres e mães!

-
-
Resposta

Que história linda e inspiradora, amo demais tudo isso, será mãe eh mesmo gratificante

-
-
Resposta

Relatos como esse dão mais força a quem precisa lutar com isso, boa sacada

-
-
Resposta

Artigos relacionados