A verdadeira história dos personagens do filme “Green Book”

Arte
há 5 anos

Este ano, o trabalho do diretor Peter Farrelly, Green Book: O Guia, baseado em fatos reais, venceu o Oscar de melhor filme. Os personagens principais foram interpretados por Viggo Mortensen e Mahershala Ali, que ganhou a estatueta de Melhor Ator Coadjuvante. O trabalho está causando uma sensação em todo o mundo e arrecadou milhões de dólares nas bilheterias.

Incrível.club decidiu mergulhar na história dos protagonistas na vida real e explicar por que o filme é intitulado Green Book (Livro Verde).

Como tudo começou

O filme é baseado em uma história que aconteceu nos Estados Unidos no início da década de 1970. Um talentoso pianista, o afro-americano Don Shirley, embarca em uma excursão pelos estados do sul. Para evitar problemas ao longo do caminho, ele contratou o italiano “Tony Lip” Vallelonga, segurança de uma casa noturna, para ser seu motorista e guarda-costas.

“Green Book”

“The Negro Motorist Green Book” (“O livro verde do motorista negro”), ou simplesmente “Livro Verde”, é um guia que lista restaurantes, postos de gasolina, hotéis e outros estabelecimentos onde pessoas de origem afro-americana poderiam ficar e contratar serviços. Aliás, esse livro de referência ajudava não apenas os viajantes, mas também os empresários que, desta forma, poderiam promover seus negócios.

O guia foi elaborado por um funcionário dos correios, Victor Hugo Green, e publicado pela primeira vez em 1936, em Nova York. O “Livro Verde” era vendido em postos de gasolina por todo o país e atualizado anualmente.

Em 1964, a Lei dos Direitos Civis foi promulgada e a segregação foi suspensa para todos os locais públicos.

Don Shirley

A verdadeira história deste famoso músico também não foi fácil. Don nasceu na Flórida, em uma família de emigrantes jamaicanos. Aos 2 anos começou a estudar piano e, aos 3, apresentava-se em alguns palcos. Quando criança, foi convidado para estudar no Conservatório de Leningrado (URSS, na época), mas seus pais tinham medo de deixar uma criança ir sozinha para um país estrangeiro.

Aos 18 anos, Don Shirley interpretou o concerto de Tchaikovski com a famosa Orquestra Sinfônica de Boston, e no ano seguinte subiu ao palco para tocar sua própria composição com a Orquestra Sinfônica de Londres

Depois disso, Don começou a viajar pelo mundo, mas apesar do sucesso, seu agente decidiu que os americanos ainda não estavam prontos para ver um pianista negro interpretando obras clássicas. Shirley ficou decepcionado e, por um tempo, abandonou sua carreira como pianista, dedicou-se a estudar psicologia e até mesmo começou a atuar como psicólogo em Chicago.

É verdade que ele logo voltaria ao mundo da música, começando a tocar em boates e até mesmo inventando seu próprio estilo musical: uma mistura de música clássica, jazz e pop. Foi assim que surgiu o trio: Don Shirley, um baixista e um violoncelista.

No melhor momento de sua carreira, o pianista apresentava mais de 100 concertos por ano em todo o mundo, mas no início dos anos 1980 ele teve que parar de tocar devido a uma inflamação em sua mão direita. Shirley desapareceu dos olhos de seus fãs por mais de 20 anos. Somente em 2001 decidiu lançar um disco, que gravou com o apoio de seus alunos.

Don Shirley morreu em 2013, aos 86 anos. De acordo com algumas informações, ele possuía o título de PhD em Música, Psicologia e Arte Litúrgica. Há certas pessoas que acreditam que estes poderiam ser apenas títulos honoríficos. Shirley falava 8 idiomas fluentemente e tinha um grande talento também para desenhar.

Tony Vallelonga

Frank Anthony Vallelonga, mais conhecido como Tony Lip, nasceu em Nova York. Na escola recebeu o apelido de Lip (lábio), ou “bom de lábia”, porque tinha a incrível habilidade de persuadir quase qualquer um a fazer o que ele queria.

Ele trabalhou como maître na boate “Copacabana” e fez muitos contatos úteis lá. Foi nessa época que aconteceram os eventos que formaram a base do enredo do filme Green Book.

No entanto, a coisa mais interessante no destino de Tony Lip ocorreria logo depois: na boate, ele conheceu o famoso diretor Francis Ford Coppola e obteve um papel extra no lendário filme O Poderoso Chefão. Sua carreira como ator começou de forma inesperada.

Ele interpretou mafiosos nos filmes Donnie BrascoDois Caras Legais, além de participar da série de televisão Família Soprano.

Em 2005, Tony Lip escreveu o livro “Shut Up and Eat!” (“Cale a boca e coma!”), No qual ele compilou receitas dos pratos favoritos de atores famosos que conheceu durante as filmagens.

Tony Vallelonga faleceu em 2013, aos 82 anos, tendo deixado dois filhos, Nick Vallelonga e Frank Vallelonga Jr. Nick também se tornou ator e ganhou fama como co-autor e produtor de Green Book.

Houve uma amizade verdadeira entre Don e Tony?

O filme é baseado no livro de Nick Vallelonga. Sendo assim, os eventos que são mostrados são guiados pelas memórias de seu pai. É bastante apropriado lembrar agora o apelido dado a Vallelonga, “bom de lábia”. É claro que não há dúvidas de que Don e Tony se conheceram e saíram juntos em turnê, mas muitas outras coisas eram muito diferentes na realidade.

O que aconteceu pouco antes dessa turnê foi realmente muito triste: vários anos antes, outro pianista negro fez uma turnê no sul dos Estados Unidos, mas durante um show, membros da Ku Klux Klan invadiram a sala e bateram nele de forma severa. É por isso que, antes de sua viagem, em 1962, Don Shirley decidiu contratar não apenas um bom motorista, mas também um guarda-costas. Para encontrá-lo, o músico foi à boate “Copacabana”, onde conheceu Tony “bom de lábia”, que trabalhava como segurança.

Quanto à amizade entre Don e Tony, o irmão do músico, Maurice, afirma que eles nunca foram amigos e conversavam exclusivamente como funcionário e empregador. Os sobrinhos de Don Shirley também confirmam essa versão. Tony ficava incomodado por ter que colocar um uniforme de motorista e carregar a bagagem, mas Don insistiu em manter a cadeia de comando. O “bom de lábia” trabalhou com Don Shirley mais do que outros motoristas, mas no final ele foi demitido. Depois disso, os dois não se comunicaram mais e não mantiveram nenhuma amizade.

Outras discrepâncias com o filme

De acordo com Maurice, outros fatos também foram distorcidos no filme. Por exemplo, Don Shirley não tinha um Cadillac turquesa, seu carro na realidade era uma limusine preta. Outro ponto era que Tony não poderia dormir no banco de trás enquanto Don o levava para casa porque ele não sabia dirigir. Além disso, Shirley não se separou de sua cultura, manteve relações com Martin Luther King e outros ativistas. Finalmente, no filme Don se mostra solitário e pouco ligado à sua família. “Isso foi muito desagradável”, afirma seu sobrinho. “E 100% errado”.

Ele mesmo disse que Nick Vallelonga sugeriu a Don que fizessem um filme sobre a viagem de 30 anos atrás, mas o músico recusou imediatamente. É claro que Nick afirma que Don Shirley o permitiu fazer o filme, mas com a condição de que fosse apenas após sua morte.

Após a estreia do filme, os parentes do músico acusaram os roteiristas de terem mentido e o ator que interpretou o papel de Don Shirley, Mahershala Alí, pediu desculpas, dizendo que não teve a oportunidade de falar com os parentes do pianista antes.

De qualquer forma, ninguém pode negar o fato de que o filme é muito bom. Talvez, algumas imprecisões e discrepâncias com os personagens da vida real até o tenham beneficiado, dando-lhe mais contraste e brilho.

Além disso, o filme não pretendia ser um documentário histórico, mas uma obra de arte. A tarefa dos roteiristas era criar um filme interessante e não uma cópia exata dos eventos.

Você já viu esse filme ou deseja vê-lo? Que outros filmes baseados em fatos reais mais o impressionaram?

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