Filhos vêm, sim, com manual de instruções (mas só para as mães)

Crianças
há 1 ano

Um pai não nasce pronto. Ele se constrói no dia a dia, na base da tentativa e do erro. O mais importante é aprender com as lições da vida e celebrar cada conquista de seu filho. Neste Dia dos Pais, nosso autor Danilo Vivan escreveu um artigo sobre os desafios e alegrias da paternidade.

Incrível.club apresenta um texto como uma homenagem àqueles que aprendem diariamente com seus pequenos.

“Filhos não vêm com manual de instrução”, diz um famoso ditado. Bem, disso tenho certeza. Pelo menos no nosso caso, pais. No caso das mães, tenho cá minhas dúvidas. Talvez elas recebam, sim, um manual (ou no mínimo, um pequeno guia) logo que os pequenos nascem e o escondam de nós a vida inteira. Vejam, por exemplo, a desenvoltura com que fazem um bebê dormir. A facilidade com que lhes dão banho. Pensem naquele olhar, de doçura ou de seriedade, que como mágica acaba com qualquer choro. Coisas que, para nós, são um completo mistério.

Mas se você quer ser um pai de verdade, amigo, terá de aprender tudo isso. Na marra e sem o manual que elas teimam em esconder de nós. Um pai não nasce pronto. Ele se constrói no dia a dia.

Nossa odisseia começa ali mesmo na maternidade. No meu caso, lembro-me direitinho da cena. A família inteira assistindo àquele momento mágico, minha esposa anestesiada, mas sorrindo e, de repente, meu filho, ainda todo ensanguentado, é retirado lá de dentro e o vejo pela primeira vez. Como em um comercial de TV, passa um filme pela minha cabeça, desde o casamento, a notícia da gravidez, tudo. E, claro, desabo em lágrimas. Mas logo, a enfermeira me põe nos braços aquela coisinha de menos de 50 centímetros e uns 3 kg e bate uma sensação de pânico. “Meu Deus, como é que eu seguro? E se ele escorregar e cair?!” E é só o começo, amigo.

Depois, vêm os inesquecíveis momentos do primeiro banho (e se ele se afogar?) e da primeira troca de fraldas, esse, sim, um verdadeiro acontecimento. Por mais que esteja acostumado com coisas nojentas, você terá um segundo de hesitação antes de pôr as mãos pela primeira vez em uma fralda suja do seu filho.

Trocar fraldas exige certa “ciência”, leva um tempo para aprender. É preciso acomodar seu bebê no trocador — que, por sua vez, deve ser à prova de vazamentos, para o caso de um eventual xixi fora de hora —, fazer uma boa assepsia das partes íntimas, caprichar no arremate com creme antiassaduras e, por fim, acertar na dobra e na fixação da fralda nova. Tudo sem sujar demais os dedos com o produto que seu filho acaba de deixar ali. Sem muita intimidade (e sabendo que sua esposa fará aquilo no ritmo que uma equipe de Fórmula 1 realiza um pit stop), você encara a missão pela primeira vez. E pela segunda. E pela enésima. Até que um dia, atinge o estado da arte na troca de fraldas. É quando você passa a dirigir um olhar meio que de orgulho meio que de desprezo aos seus colegas que ainda não dominam a técnica. Você já está no próximo nível.

Com o tempo, como ocorre nas grandes empresas, você vai sendo “promovido” conforme suas habilidades aumentam. Duas das que eu mais prezo hoje em dia são a de lavagem de mamadeiras e a de regulagem da cadeirinha no carro.

Falemos da primeira. Para começo de conversa, lavar uma mamadeira não é o mesmo que lavar seu copo de cerveja. Afinal, seu organismo é muito mais resistente que o do seu filho. Além disso, mamadeiras possuem bicos e cantos misteriosos para um pai de primeira viagem e que devem ser limpos para evitar que o leite grude e comece a fermentar. Uma série de detalhes dos quais você não faz a menor ideia até seu filho nascer. Existe até mesmo uma escova especial para lavar mamadeiras. No início, você não vai saber sequer como pegar essa escova, mas, com o tempo, começa a fazer aquilo com uma habilidade capaz de matar de inveja qualquer funcionário de maternidade. Vai saber até como usar a pontinha de trás (a parte oposta a das cerdas), que possui ranhuras quase invisíveis aos olhos dos leigos e que servem justamente para limpar o bico. Hoje, sou capaz de lavar quatro mamadeiras em dois minutos. Cronometrados.

Outra ciência paterna diz respeito a colocar a cadeirinha para bebês no banco de trás do carro e, depois, colocar seu filho nela. No início, é fácil se perder entre aquelas inúmeras travas, passadores e botões com infinitas regulagens. “Como é que alguém é capaz de complicar algo que deveria ser tão simples?”, você pensa. Mas com algum treino (e alguns tutoriais do YouTube), aquele processo todo se torna algo meio automático, como dar um nó em gravata para quem trabalha em escritório.

Sem o manual que sua esposa esconde e tendo de aprender na base da tentativa e erro, você passará por esses testes e pelos das cólicas, dos choros de madrugada pedindo leite (e conseguirá preparar uma mamadeira perfeita às 2h da madrugada sem que seu cérebro precise desligar o modo “dormindo” e acionar o modo “acordado”). E então chegará a fase das grandes conquistas.

Seu filho dará os primeiros passos. Uns passos tímidos, meio inseguros, mas totalmente cheios de energia. Acompanhar os primeiros passos de uma criança é testemunhar um milagre. Um dos maiores milagres desta vida, talvez comparável ao próprio nascimento. Um filme passará por sua cabeça imaginando aonde aqueles passos o levarão ao longo de uma vida. Depois, ele dirá “pa-pai” pela primeira vez. E pela segunda. E você ficará com cara de bobo cada vez que ele disser isso. E vai vibrar por dentro como se estivesse comemorando um título quando ele fizer cocô no penico pela primeira vez. A essa altura, sujar as mãos na troca das fraldas será algo trivial.

Mas, como disse uma amiga certa vez, a maternidade e a paternidade são como um jogo de videogame. Quando nos tornamos craques em uma determinada habilidade, “passamos de fase” e voltamos à estaca zero do aprendizado.

Aprender a andar abre as portas do mundo para uma criança. Um mundo de descobertas e de conquistas. E chega aquele momento em que, quando as coisas estão muito quietas em casa, algo está errado. Seu primeiro impulso será eliminar do cenário doméstico todos os enfeites, livros e objetos que mais ama para que aquele pequeno destruidor não acabe com tudo. Mas você aprenderá que o mais importante é encontrar um equilíbrio entre educá-lo, deixar a casa minimamente arrumada e deixá-lo explorar o mundo. No final das contas, qual a importância de ele ter escavado seu vaso de plantas preferido? As lembranças ficam, o vaso vai se perder na memória.

E então eles começam a ter gostos e atitudes. Pequenos episódios de birra talvez sejam um sintoma de que estão deixando de ser bebês. Estamos no elevador, indo para o carro levar meu filho mais velho para a escola. São 6h30 da manhã. Ele grita. “Não, não quero ir para a escola! Não!!!!” A mãe, para acalmá-lo, o coloca no colo. O mais novo, em pé ao lado, logo percebe e conclui que também merece aquele espaço no colo materno. E começa a berrar. São dois berrando no elevador às 6h30 da manhã. Minha esposa se irrita. Está atrasada para o trabalho. Não somos uma família de propaganda de margarina por mais que, às vezes, as fotos das férias em alguma praia sugiram isso. Ou por mais que nossos amigos encham nossas timelines com expressões como “lindos!” ou “que família maravilhosa!” nas redes sociais. Na prática, como diriam, a teoria é outra. Estamos crescendo com eles e parece que, às vezes, nem o manual secreto das mães funciona.

Mas um dia, ele voltará da escola e abrirá o caderno todo orgulhoso para mostrar que, pela primeira vez, conseguiu escrever a letra inicial do próprio nome. E você, de novo, se encherá de orgulho. Sentirá como sendo um pouco sua cada uma daquelas pequenas/grandes conquistas. E sentirá, lá no fundo da alma, aquela sensação de que está valendo a pena.

Um pai se constrói todos os dias. “Passamos de fase”, somos “promovidos”, mas temos certeza de que logo na sequência virá um desafio ainda maior e nunca estamos totalmente preparados para enfrentá-lo.

Então, neste Dia dos Pais, desejo a você, pai, mãe, padrasto ou quem quer que tenha assumido essa emocionante, mas desafiadora responsabilidade, que aprenda todos os dias. E que aproveite cada minuto desse aprendizado. Feliz Dia dos Pais.

Imagem de capa Stock/Depositphotos

Comentários

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Eu acho que a gente se torna pai/mãe ao longo do tempo, ninguém nasce sabendo

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Resposta

Concordo, nem pai nem mãe nascem prontos. Não existe instinto materno, nós aprendemos com a experiência dos mais velhos e com a prática do dia a dia

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Resposta

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