O homem que teve soluços por 68 anos seguidos
Uma vez a cada dois meses você tem crises de soluços, que duram de 10 a 20 minutos, e acha que isso é horrível? Oh, minha doce criança. Imagine ficar assim por 68 anos seguidos. O que acha? Um homem chamado Charles Osborne tinha um jeito muito engraçado de falar, que desenvolveu para esconder o som de seus soluços intermináveis. O cara estava soluçando sem parar desde 13 de junho de 1922, por mais de 68 anos! A história é a seguinte: Osborne nasceu em 1893 e começou a soluçar depois de um pequeno acidente em uma fazenda em Nebraska. Ele caiu, mas não sentiu nada estranho até começar a soluçar loucamente. Os médicos acham que o acidente pode ter danificado uma pequena parte de seu cérebro que ajuda a interromper o reflexo do soluço.
Existem algumas teorias diferentes sobre o que pode ter causado o problema. Algumas pessoas acham que ele pode ter machucado as costelas durante a queda e isso mexeu com o músculo do diafragma. Outras acreditam que bateu a cabeça e teve um derrame. De qualquer forma, o cara ficou preso aos soluços pelo resto da vida. Você consegue imaginar ter de 20 a 40 espasmos involuntários do diafragma por minuto durante tanto tempo? Quando Osborne finalmente parou de soluçar, provavelmente já havia feito isso cerca de 430 milhões de vezes no total, durante toda a sua vida de 97 anos. Era uma situação tão ruim que ele consultou vários médicos, às vezes viajando para bem longe, mas ninguém conseguiu resolver o problema.
Um deles até tentou auxiliá-lo, colocando-o em uma mistura de monóxido de carbono e oxigênio, o que ajudou um pouco. Mas isso acabou sendo uma má ideia, pois respirar o gás venenoso não era uma solução segura. No fim, Osborne teve de aprender uma técnica especial de respiração para minimizar o som de “hic” que vinha com cada espasmo. Ele respirava entre esses movimentos e flexionava o peito algumas vezes por minuto para suprimir o ruído. Ainda era óbvio que estava soluçando, já que se agitava e se sacudia, mas pelo menos não era tão alto.
Osborne estava nessa situação havia 56 anos quando ficou famoso ao dar uma entrevista em 1978. Ele disse que faria qualquer coisa para se livrar dos soluços e que nem mesmo sabia como seria não tê-los. E ficava constantemente dolorido por causa de todos os solavancos e espasmos. Depois de se manifestar, recebeu muita atenção da mídia. Até chegou a ser listado no Guinness World Records e apareceu em programas de TV, como o “The Tonight Show Starring Johnny Carson” e o “That’s Incredible”. Pessoas de todo o país lhe enviaram cartas com sugestões de como curar aquilo, mas nenhuma delas funcionou por mais de um tempo. No entanto, essa provação não impediu que Charles Osborne levasse uma vida relativamente normal. As pessoas o conheciam como um cara alegre e sortudo que adorava fazer piadas e não falava muito sobre sua doença. Ele se casou duas vezes e teve oito filhos. Para sobreviver, vendia máquinas agrícolas e leiloava animais.
Em 1990, por motivos que ainda são um mistério, os soluços de Osborne pararam repentinamente após mais de seis décadas. Infelizmente, ele faleceu apenas um ano depois. No entanto, aposto que seus últimos meses foram muito felizes sem aquele tormento! Apesar de todos os avanços médicos feitos desde aquela época, ainda não há uma maneira infalível de curar soluços prolongados. Eles são um fenômeno estranho que existem desde o início da existência dos mamíferos. Ainda não entendemos completamente por que acontecem ou para que servem. Aos poucos, os pesquisadores estão descobrindo as respostas sobre o motivo por que ocorrem e como podemos pará-los. Sabemos que são uma ação reflexa, semelhante à forma como a perna treme quando o médico bate em nosso joelho com um martelo.
Esse reflexo é encontrado em muitos mamíferos, desde animais domésticos, como cães e gatos e coelhos, até maiores, como cavalos. Quando soluçamos, um sinal nervoso viaja do diafragma, que é o músculo localizado na parte inferior dos pulmões, para o cérebro e vice-versa. Esse processo é repetido várias vezes, fazendo com que o diafragma se contraia e os pulmões se expandam. No entanto, no meio da inspiração, um reflexo faz com que a epiglote, que é uma aba de tecido localizada na parte superior da garganta, se feche repentinamente, criando o som característico de “hic”. É assim que soa o fechamento repentino das cordas vocais. Esse ciclo continua até que o reflexo seja interrompido por algo como prender a respiração ou beber água.
O soluço é causado pelo nervo frênico, um cordão longo e de formato estranho que vai do tórax até o diafragma. Ele apareceu pela primeira vez nos ancestrais dos mamíferos que eram parecidos com os peixes, mas o deles era mais curto e se conectava diretamente às brânquias próximas ao cérebro, em vez de irem até o diafragma. O reflexo dos soluços pode ter sido útil para os anfíbios que viviam em terra, pois eles precisavam alternar entre a respiração debaixo d’água, com brânquias, e a aérea, com os pulmões. A aba da epiglote se fechava e, assim, enviava água para a boca e as brânquias, impedindo que ela fosse para os pulmões.
Entretanto, como os seres humanos não vivem embaixo d’água e não possuem brânquias, por que os soluços ainda existem? Por exemplo, os bebês tendem a soluçar com mais frequência do que os adultos, especialmente quando mamam. Ao beber, eles também engolem ar, e os soluços podem ser a maneira do corpo de limpá-lo do estômago. Esse reflexo pode funcionar como um arroto autoiniciado.
É interessante notar que não são apenas os bebês que soluçam muito. Até mesmo fetos com 10 semanas foram observados fazendo isso. Esse processo pode servir para treinar o cérebro a mapear o interior do corpo. Em outras palavras, eles precisam aprender onde o diafragma está localizado e como controlar a respiração, e os soluços podem ajudá-los a “praticar” a respiração para que estejam prontos quando nascerem.
Aproximadamente 4.000 pessoas procuram atendimento médico para essa condição a cada ano nos Estados Unidos. Como se livrar dos soluços é uma das perguntas sobre saúde mais pesquisadas no Google. A maioria se resolve por si só em dois dias, mas crises mais prolongadas talvez indiquem um problema subjacente, como um tumor cerebral. Às vezes, os pacientes apresentam soluços contínuos que não desaparecem mesmo após acompanhamento médico. Nesse caso, apenas o tratamento da condição subjacente ajuda.
Os médicos vêm tentando diferentes medicamentos que visam a relaxar os músculos e os nervos que podem causar espasmos no diafragma, mas não há evidências claras o suficiente para recomendar um tratamento específico. Um grupo de pesquisa japonês descobriu um novo método, que envolve a respiração com alta concentração de CO2. Isso leva o cérebro a pensar que há uma emergência com risco de morte, fazendo com que ele esqueça os soluços. No entanto, se não puder viajar para o Japão para fazer esse tratamento, você pode tentar algumas histórias da carochinha que comprovadamente funcionam, como beber um copo inteiro de água de um só gole, ficar de cabeça para baixo ou tomar um susto.
Esses processos funcionam interrompendo o arco reflexo, de modo que os nervos e os músculos são distraídos por outra coisa. Essa é uma conclusão feita por Ali Seifi, um neurointensivista que ficou obcecado em encontrar uma cura depois de ver um paciente acordar com soluços inexplicáveis após uma cirurgia cerebral.
Beber água rapidamente, por exemplo, força o diafragma a continuar criando sucção, o que mantém o nervo frênico ocupado. Isso interrompe uma parte do reflexo. Da mesma forma, ficar com medo ativa o nervo vago, o que tem um efeito calmante, interrompendo assim a outra parte do reflexo. Ali Seif criou uma ferramenta chamada Hiccaway, que é mais consistente do que os métodos tradicionais, pois ajuda a combinar os dois efeitos. Ele se parece com um canudo que exige que a pessoa sugue com muita força, como se estivesse bebendo um milkshake espesso, envolvendo os dois nervos e acabando com os soluços de forma eficaz.