“Eu só preciso de uma vaga”, como a menina do interior que se formou numa Universidade Federal provou que o estudo é capaz de mudar vidas
Em 2000, o IBGE mostrou que apenas 4,4% dos brasileiros possuíam ensino superior completo, provando que se formar não é uma tarefa fácil, e nem para qualquer um. No entanto, os brasileiros também provaram sua força, determinação e superação. A história de hoje irá contar um caso em que, mesmo diante de adversidades, uma garota realizou o sonho de se formar.
O Incrível.club realizou uma entrevista exclusiva com Talila Figueiredo, uma jovem que cresceu em um povoado sergipano e conseguiu se formar em nutrição. Queremos compartilhar essa história com vocês. Confiram!
“Eles sabiam que a nossa realidade podia ser diferente se estudássemos”
“Meu pai é pedreiro e a minha mãe, dona de casa. Ambos viveram à base do trabalho rural e ir para a roça era a realidade que tinham. Meu pai só sabe ler e escrever o básico, pois estudou até a 2ª série do ensino fundamental. Já minha mãe estudou até a 7ª série do ensino fundamental. A vida deles foi muito difícil, cheia de obstáculos. Durante muitos anos meu pai trabalhou como pedreiro em Salvador — Bahia, pois lá o salário e os benefícios eram melhores e com isso ele teria condições de proporcionar maior qualidade de vida para nossa família. Nós só víamos ele uma vez no mês, quando ele vinha passar um final de semana aqui no nosso povoado”, contou Talila.
Ela e seus irmãos nunca trabalharam na roça, pois sua mãe dizia: “Eu trabalhei na roça e hoje colho os frutos disso. Mas vocês irão estudar e colher frutos melhores, pois somente o estudo pode mudar a vida de vocês”. Dessa maneira, o requisito mínimo nessa família foi a excelência na escola e no comportamento, pois acreditavam que ambos estavam relacionados. “Eles sabiam que a nossa realidade podia ser diferente da deles, que nós poderíamos ter melhores oportunidades, melhor qualidade de vida se estudássemos. Então eles fizeram de tudo para que isso se tornasse realidade”, revelou.
O povoado que foi a base de tudo
Talila nasceu e cresceu no povoado Monte Coelhos, município de Tobias Barreto, Sergipe. O povoado não possui sinal de telefone, mas é desenvolvido: possui asfalto, água encanada, energia elétrica. No entanto, o que predomina é a agricultura, o trabalho braçal. Ela estudou todo o ensino fundamental na escola de seu povoado. Essa escola só oferecia os anos iniciais, ou seja, disponibilizava até o ensino fundamental. Então, para que os moradores daquela região pudessem fazer o ensino médio, tinham que ir para outro povoado mais desenvolvido.
Em 2015 concluiu o ensino médio, realizou a prova do Enem, mas não conseguiu ser aprovada em nenhuma faculdade. “Não desisti, tinha um sonho e sabia que, para que isso pudesse se tornar realidade, eu teria que conseguir uma bolsa em alguma Universidade Pública (por isso queria a Federal), pois meus pais não teriam condições de arcar com os custos de uma faculdade”, compartilhou com nossa equipe.
Em 2016, ela resolveu que colocaria foco apenas nisso: “Iria estudar até conseguir a minha vaga na Universidade Federal”. A família não tinha como pagar cursinhos preparatórios, então começou a estudar por conta própria, até que um amigo contou que havia um curso gratuito de pré-vestibular promovido pelo governo. Ele falou com a diretora e Talila conseguiu uma vaga para estudar nesse curso.
Talila só precisou de uma oportunidade
Após duas tentativas, ela conseguiu a aprovação. Entrou em último lugar e foi a última aprovada em nutrição daquele ano. A colocação não importava, o que importava era a aprovação, pois sempre dizia: “Eu só preciso de uma vaga, apenas uma, nem que fosse a última”. Sua mãe entrou pela porta de casa chorando, a parabenizou e disse uma frase que a marcou: “É difícil ver uma filha querendo estudar e eu não ter condições de dar isso. Hoje ela conseguiu uma bolsa para estudar de graça e fazer a faculdade dela”.
Na realidade de sua comunidade, ter uma graduação era difícil e talvez impossível. Antes só fazia faculdade quem tivesse conseguido financiamento. Ninguém nascido e crescido naquele povoado sequer pensou em tentar uma bolsa em alguma universidade, independente do método. A maioria pensava que conseguir uma bolsa em uma universidade pública era impossível. Talila é a primeira pessoa nascida e crescida na minha comunidade a conseguir uma bolsa em uma Universidade Federal e, principalmente, no curso dos seus sonhos. “Aquilo que parecia impossível, tornou-se possível”, disse. Ela tinha a certeza que a realidade em que vivia não determinaria o seu futuro.
O sonho se concretizou e ela não poderia estar mais feliz
Desde que foi aprovada, Talila lutou para conseguir os auxílios na Universidade para os alunos mais carentes. Se inscreveu, conseguiu a residência universitária (uma casa onde as despesas eram pagas pelo governo) e também o auxílio-alimentação (bolsa mensal no valor de R$ 200,00). “Esses programas me mantiveram na universidade até a conclusão do curso.” No último ano de graduação, ela conseguiu fazer parte de um projeto em que recebia R$ 400 por mês e foi com esse dinheiro que conseguiu arcar com os custos da formatura.
“Eu sabia qual era a realidade da minha família e que eles não teriam condições de arcar com os custos. Os gastos que tiveram comigo durante esses anos foram mínimos. Alguns finais de semana vinha para casa, aproveitava para levar alguns alimentos para minha casa universitária e eles ajudavam com transporte e alimentação. Por entender a minha realidade, não saía para festas para evitar ter enormes gastos. Enquanto estava estudando, meu foco era viver ao máximo esse tempo: participei de congressos, cursos, projetos de extensão, liga acadêmica, monitoria, fazia de tudo”, relembrou.
Os professores logo viram sua disponibilidade e interesse, o que conquistou a admiração e o respeito deles. Foi convidada a participar da publicação de um livro, com os grandes doutores da Universidade Federal de Sergipe. “Participei como coautora de um livro e, no terceiro ano de graduação, publiquei meu primeiro livro.”
“Não existe nada que pare uma pessoa altamente determinada a alcançar aquilo que tanto almeja. Os sonhos são combustíveis para nossa vida, nos fazem querer e almejar sempre mais. Porém, o que faz com que isso se torne realidade é a determinação e constância. A presença e incentivo dos pais são cruciais na criação e desenvolvimento dos filhos. Sem o apoio e incentivo dos meus pais eu não conseguiria ter ido tão longe. Lute pelos seus sonhos, eles são a única coisa capaz de nos proporcionar uma realidade melhor”, destacou Talila.
É realmente incrível concretizar seus objetivos e sentir que venceu, não é mesmo? Você já passou por alguma história de superação ou conhece alguém que tenha passado? Entre em contato conosco ou compartilhe seu relato nos comentários 😉