15 Mulheres brasileiras que fizeram pela primeira vez algo que hoje consideramos normal

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há 1 ano

Hoje, as mulheres podem votar, escrever um livro, ir à praia de biquíni, montar uma banda de rock, apitar um jogo de futebol, fazer acrobacias aéreas ou alistar-se no exército, ou o que mais tiverem vontade. Mas houve tempos em que estas coisas (e muitas mais) não eram permitidas a elas. Ou eram vistas com maus olhos.

Algumas pioneiras da nossa história, porém, venceram obstáculos e preconceitos para que as gerações seguintes pudessem usufruir de suas conquistas, que não foram poucas.

Incrível.club relembra a vida, a obra e o pensamento de algumas brasileiras precursoras na literatura, na música, no esporte, na política, na ciência e nos costumes.

1. Maria Quitéria, a primeira mulher a lutar no exército brasileiro pela independência do País

As garotas que hoje sonham em fazer carreira nas Forças Armadas do Brasil devem muito à baiana Maria Quitéria de Jesus (1792-1853). Em uma época em que nem se podia imaginar uma mulher no campo de batalha, esta moça nascida em Feira de Santana vestiu roupas de homem e alistou-se com o nome de Soldado Medeiros em um regimento, pois queria defender a independência do País.

Apesar de a independência ter sido proclamada em 1822, alguns setores da sociedade e algumas regiões brasileiras mantinham-se fiéis à coroa portuguesa. Ao grito do Ipiranga, seguiram-se conflitos que determinaram a Guerra da Independência.

Quitéria fugiu de casa para cumprir sua própria vontade, contrariando o pai. Em 1823, lutou em várias batalhas e foi condecorada como heroína da independência por D. Pedro I. Foi reconhecida oficialmente como militar e aposentou-se como tal. Casou-se com um lavrador, teve uma filha e morreu em Salvador, aos 61 anos.

2. Maria Firmina dos Reis, a primeira escritora a lançar um romance no Brasil

Maria Firmina dos Reis (1822-1917) foi a primeira mulher a publicar um romance no Brasil. Úrsula, editado em 1859, pode parecer à primeira vista uma história romântica sobre um amor impossível. Porém, é a primeira obra abolicionista da literatura brasileira, cuja narrativa traz o ponto de vista dos escravizados.

Nascida em São Luís (MA), Firmina foi professora e fazia tudo de forma diferente. Na época, castigos corporais eram comuns na escola, mas essa mestra preferia o diálogo e o aconselhamento, segundo depoimento de alunos. Contrariando outra regra (a que separava os meninos das meninas na escola), formou uma turma mista de alunos que não podiam pagar pelo ensino.

Ela não assinou a primeira edição de Úrsula, apenas indicou que a história fora escrita por “uma maranhense”. O livro só voltou a ter uma nova edição em 1975. Nos últimos tempos, tem crescido o interesse pela obra de Maria Firmina, que também escreveu poemas e compôs música.

3. Chiquinha Gonzaga, a primeira compositora de sucesso da nossa música popular

Francisca Edwiges Neves Gonzaga (1847-1935) foi a primeira mulher a destacar-se como compositora e maestrina no Brasil. Casou-se muito nova, aos 16, como era costume na época. Seis anos depois, chocou a sociedade do Rio de Janeiro ao separar-se do marido, o que não era nada comum. Queria liberdade para fazer música.

Livre das amarras da tradição, Chiquinha tornou-se uma figura conhecida nas rodas cariocas de choro, gênero musical que nascia. Era amiga dos músicos, apresentava-se ao piano e fumava em público (mulheres não faziam isso naquele tempo). Suas ideias também eram avançadas: defendia a república e militou pelo fim da escravidão. Teve antepassados escravizados, por parte de mãe.

Além do choro, Chiquinha deixou partituras em vários gêneros musicais e atuou como compositora de teatro. Sua música é até hoje interpretada por pianistas populares e clássicos não só brasileiros, mas de várias nacionalidades.

4. Nair de Tefé, a primeira-dama que desenhava caricaturas e levou o samba ao palácio

Nair de Teffé von Hoonholtz (1886-1981) era uma mulher à frente do seu tempo, com talentos que não se limitavam às tarefas domésticas. Foi cantora, pianista, atriz e a primeira mulher caricaturista do Brasil. Publicou vários desenhos de celebridades da moda em revistas do Rio de Janeiro, até tornar-se primeira-dama do País, casada com o presidente Hermes da Fonseca (ele governou entre 1910 e 1914).

Educada na França, tinha uma visão aberta do mundo e causou furor como primeira-dama. Em 1914 organizou um sarau no Palácio do Catete para o lançamento do Corta-Jaca, um maxixe composto por sua amiga Chiquinha Gonzaga.

A alta sociedade não perdoou Nair pela ousadia: considerava-se um escândalo levar ao palácio presidencial “a mais baixa, a mais chula, a mais grosseira de todas as danças selvagens, a irmã gêmea do batuque, do cateretê e do samba”, como disse Rui Barbosa em pronunciamento no senado. Nair não deu bola e seguiu sendo uma mulher das artes e de vanguarda até sua morte, aos 95 anos.

5. Celina Guimarães Viana, a primeira mulher a votar no País

Hoje todas as mulheres do País tem o direito de escolher seus representantes nos âmbitos municipal, estadual e federal, incluindo o presidente da república. Nos tempos de juventude da professora Celina Guimarães Viana (1890-1972), elas simplesmente não podiam votar. Celina foi a primeira brasileira a conquistar este direito, tendo seu nome incluído na lista de eleitores de Mossoró (RN) em 1927.

Antes dela, vários movimentos já lutavam pelo voto feminino e pelo direito das mulheres se candidatarem a cargos eletivos, o que também lhes era negado. O estado do Rio Grande do Norte foi o primeiro a reconhecer o voto feminino, mas ainda havia restrições. A inscrição de Celina foi aceita por ela ser casada e respeitada na sociedade potiguar.

Como professora, Celina também era avançada para sua época. Escrevia peças, desenhava figurinos e usava o teatro como instrumento para o aprendizado. Foi também uma grande divulgadora do futebol no Rio Grande do Norte, esporte que ainda não era popular em todo o País. Celina levava os alunos para o campo e apitava os jogos.

6. Bertha Lutz, ativista do voto feminino e pioneira dos direitos da mulher no Brasil

Bertha Lutz (1894-1976) foi uma das grandes responsáveis pelo voto feminino e por outras conquistas femininas no país. Nascida em São Paulo e filha do cientista Adolfo Lutz, Bertha formou-se em Ciências Naturais na Universidade de Sorbonne (França) e especializou-se no estudo dos anfíbios. Foi a segunda mulher a fazer parte do serviço público no Brasil, tornando-se secretária concursada do Museu Nacional, em 1919.

Bertha fundou diversas organizações em defesa dos direitos da mulher. Duas de suas principais batalhas foram o voto feminino e a inclusão da mulher no ensino superior, o que naqueles tempos era uma raridade. Em 1932, as mulheres puderam votar em todo o território nacional. Mas foi uma vitória parcial: só iam às urnas as casadas (com autorização do marido), as viúvas e as solteiras que comprovassem sua própria renda. Apenas em 1946 o voto no Brasil se estendeu a todas as adultas irrestritamente.

Outras preocupações de Bertha eram a equiparação salarial entre homens e mulheres, o direito à licença-maternidade e a luta contra o trabalho infantil. Viajou para vários países palestrando, participando de congressos e defendendo suas ideias.

7. Carlota Pereira de Queirós, a primeira deputada federal eleita pelo voto popular

As mulheres foram ganhando espaço lentamente na política brasileira. A primeira prefeita eleita foi Alzira Soriano, em 1928, na cidade de Lajes (RN). Em 1933, a paulistana Carlota Pereira de Queirós (1892-1982) foi a primeira a ser eleita deputada federal, pelo estado de São Paulo.

Carlota era médica formada pela Universidade de São Paulo, a primeira escola pública de nível superior do estado a admitir o ingresso de mulheres. Em seu mandato, defendeu especialmente as crianças e melhorias educacionais para as mulheres.

Exerceu o cargo de deputada até 1937, quando o presidente Getúlio Vargas liderou o golpe que fechou o Congresso Nacional.

8. Nise da Silveira revolucionou o tratamento dos doentes mentais com a arte e tornou-se referência internacional

Nise da Silveira (1905-1999) sempre foi uma rebelde. Uma das primeiras mulheres a formar-se em Medicina no Brasil, na Universidade da Bahia, em 1931, casou-se com um colega de turma, Mario Magalhães da Silveira, especializado em sanitarismo. Nise escolheu a psiquiatria, e também foi uma das primeiras brasileiras a especializar-se nesta área.

Em 1944, ela conseguiu uma colocação no Centro Psiquiátrico Nacional Pedro II, no Rio de Janeiro. Sua perplexidade diante dos métodos terapêuticos da época, no entanto, lhe trouxe problemas. Nise negava-se a aplicar eletrochoques nos pacientes mentais. Acreditava que outras formas mais humanas de terapia eram possíveis.

Ela foi colocada no serviço de terapia ocupacional, área menosprezada pelos médicos, mas ali começou a fazer sua grande revolução. Criou ateliês de pintura e escultura para os pacientes, que começaram a buscar sua conexão com a realidade por meio da arte. Seu trabalho foi reconhecido pelo psicoterapeuta suíço Carl Jung, de quem foi aluna e que a incentivou a expor mundo afora as obras do Museu de Imagens do Inconsciente, que foi criado por iniciativa dela.

O trabalho terapêutico de Nise da Silveira foi reconhecido, disseminado e condecorado em várias partes do planeta. A atriz Glória Pires interpretou sua história no filme Nise — O Coração da Loucura (2015), do diretor Roberto Berliner.

9. Joaninha Castilho, nossa primeira acrobata dos ares

Quando criança, a brincadeira preferida de Joana Martins Castilho D’Alessandro (1924-1991) era pular de árvore em árvore. Cresceu mais um pouco, ficou apaixonada pela aviação e seus pais a incentivaram a aprender a pilotar, fazendo economias para que a filha pudesse realizar seu sonho.

Com 14 anos, Joana fez seu primeiro voo solo sobre Taubaté, cidade paulista onde foi criada. Aos 15, já estava tão bem treinada que podia fazer acrobacias aéreas. Em 1940, ganhou o concurso da Semana da Asa, feito que a colocou no Guinness Book como a mais jovem acrobata aérea do mundo.

Joaninha, como ficou carinhosamente conhecida, ganhou o apelido de Águia de Taubaté. Seu rosto chegou a ser estampado no rótulo de uma marca de refrigerante local, o Guaraná Joaninha.

10. Mercedes Baptista, a primeira bailarina negra a integrar o corpo de baile do Municipal do Rio de Janeiro

Mercedes Baptista (1921-2014) nasceu no interior do estado do Rio de Janeiro, foi para a capital ainda jovem, trabalhou como empregada doméstica e como bilheteira de cinema. Encantada com os filmes musicais, foi admitida como aluna na Escola de Danças do Theatro Municipal.

Após prestar um concurso público, em 1948, foi a primeira mulher negra a integrar o corpo de baile do Municipal carioca. Esta vitória, no entanto, não garantiu seu sucesso na companhia. Mercedes era excluída das grandes produções e sempre acreditou que isso se devia ao fato de ser negra.

Mercedes não esmoreceu e passou a atuar no Teatro Experimental do Negro, onde teve o talento notado pela coreógrafa americana Katherine Duhnam, que a levou para estudar nos Estados Unidos. Ao voltar, fundou o Ballet Folclórico Mercedes Baptista, unindo a dança clássica a nossas tradições culturais.

Como coreógrafa, uma de suas inovações foi levar a técnica clássica ao desfile da escola de samba Salgueiro, em 1963. Foi bastante criticada pela ousadia, mas hoje muitas escolas mantêm em sua formação a famosa “ala do minueto”, criada por Mercedes.

11. Johanna Döbereiner, a cientista brasileira mais citada pela comunidade científica internacional

Há muitas mulheres de destaque na nossa ciência, mas Johanna Döbereiner (1924-2000) tem o mérito de ser a única brasileira indicada ao prêmio Nobel. Ela nasceu na Suíça, sua família foi perseguida pelo nazismo durante a Segunda Guerra Mundial e a mãe morreu em um campo de concentração. Casou-se com um estudante de veterinária em 1950, formou-se agrônoma e o casal decidiu mudar-se para o Brasil.

Johanna foi contratada pelo Instituto de Ecologia e Experimentação Agrícola (atual Embrapa), no estado do Rio de Janeiro. Como pesquisadora, descobriu uma tecnologia eficiente e econômica de adubar a soja, produto no qual o Brasil começou a investir na década de 1960 e que até hoje representa uma grande fonte de divisas para o País.

Seus estudos com a cana-de-açúcar também foram fundamentais para que o Brasil desenvolvesse o Programa Nacional do Álcool e lançasse este derivado como combustível, causando uma revolução no abastecimento a partir dos anos de 1970.

Johanna naturalizou-se brasileira em 1956, foi premiada mundialmente e até hoje seu trabalho é uma sólida referência. Figura na sétima colocação entre os cientistas brasileiros mais citados pela comunidade científica internacional, sendo a primeira entre as mulheres do País.

12. Rita Lee tocou rock na televisão quando as garotas ainda não eram “autorizadas” a fazer isso

Nos anos 1960, uma garota podia até cantar alguns rocks suaves e românticos, como fez a primeira musa do gênero no País, Celly Campello. Porém, subir no palco com uma banda de rock de garotos, empunhando uma guitarra elétrica em um festival de música brasileira transmitido pela televisão, era um sacrilégio contra os bons modos e o bom gosto. A paulistana Rita Lee (1947) foi pioneira com esta atitude ao integrar Os Mutantes, banda que colocou nossa música de pernas para o ar.

Ao separar-se dos Mutantes, no começo da década de 1970, Rita também trouxe o ponto de vista feminino para a nossa canção popular. Até aquela época, era comum que as cantoras dissessem letras escritas na voz de um personagem masculino. Rita sempre falou sobre o que quis nas suas músicas: amor, sexo, relacionamentos, diversão e a vida cotidiana de todos nós, de um jeito leve e bem humorado.

Hoje Rita está quietinha, vive em seu sítio e não quer saber mais dos palcos, mas todo mundo tem pelo menos uma música sua que lembra algum momento especial, entre as dezenas de sucessos que lançou nas paradas.

13. Leila Diniz quebrou vários tabus e tornou-se símbolo da emancipação feminina no Brasil

No final dos anos 60, Leila Diniz (1945-1972) foi revelada como atriz pelas novelas da Rede Globo, que naquele tempo começavam a conquistar grande audiência. Era uma garota irreverente que não tinha medo de dar sua opinião sobre o que quer que fosse.

Em 1969, deu uma entrevista histórica ao jornal O Pasquim, dizendo o que bem pensava sobre a vida, sobre o sexo e sobre o relacionamento entre homens e mulheres. Pela ousadia de Leila e do jornal, os meios de comunicação brasileiros começaram a ser censurados previamente (isto é, antes de serem distribuídos).

Um dos atos mais polêmicos de Leila, porém, foi posar grávida para fotos, de biquíni, com o barrigão de fora, em uma praia carioca, para a reportagem de uma revista. Naquele tempo, uma moça de família jamais faria isso. Hoje a atitude parece bem natural.

Leila, nascida em Niterói (RJ), morreu aos 27 anos, no auge da fama, na queda do avião que a trazia da Austrália para o Brasil. O amigo e cineasta Luiz Carlos Lacerda dirigiu o filme Leila Diniz (1987) em sua homenagem.

14. Léa Campos, a primeira mulher a apitar oficialmente um jogo de futebol no Brasil e no mundo

Em meados da década de 1960, Léa Campos (1945) era uma garota alta e elegante que vencia vários concursos de beleza em Minas Gerais. Quando foi eleita Rainha do Cruzeiro Esporte Clube, apaixonou-se pelo esporte e quis fazer parte dele como árbitra.

Já formada em jornalismo, inscreveu-se em uma escola de árbritros e concluiu o curso, mas não conseguiu receber, da então Confederação Brasileira de Despostos (CBD), o diploma que a habilitaria para apitar jogos profissionalmente. Naquela época, uma lei impedia que mulheres praticassem esportes “incompatíveis com sua natureza”. Elas não podiam jogar futebol, polo, beisebol e praticar halterofilismo e lutas, entre outras modalidades.

Léa apitava jogos amadores e chegou a ser detida várias vezes pela polícia do governo militar para prestar esclarecimentos, por “desacatar a ordem”. Mas ela não desistia. Sua teimosia a fez famosa e foi convidada pela Federação Internacional de Futebol (Fifa) para apitar um amistoso feminino no México, em 1971. Como seu diploma de árbitra ainda estava interditado pela CBD, apelou ao presidente da república, Emílio Garrastazu Médici, para que ele intercedesse por ela.

A estratégia deu certo. Médici escreveu uma carta à CBD e Léa pôde, enfim, seguir a carreira de árbitra, interrompida em 1974 por um acidente que a deixou incapacitada por dois anos. Mas ela seguiu ligada ao esporte como comentarista e incentivadora de jovens atletas.

15. Rachel de Queiroz, a primeira mulher a ser eleita imortal na Academia Brasileira de Letras, com 80 anos de atraso

O primeiro romance escrito por uma brasileira foi publicado em 1859. Mas apenas em 1977 a Academia Brasileira de Letras, fundada em 1897, aceitou uma mulher em seu time de escritores considerados “imortais”: a cearense Rachel de Queiroz (1910-2003).

Rachel foi uma voz importante no movimento literário conhecido como regionalismo, lançando aos 19 anos a obra O Quinze (1927). Este primeiro romance falava das dificuldades que uma família nordestina enfrentava em tempos de seca. Memorial de Maria Moura (1992) é seu livro mais popular, adaptado em uma minissérie da Rede Globo.

Depois de Rachel, a Academia redimiu-se de ter passado seus primeiros 80 anos sem admitir mulheres entre os imortais. Outras autoras importantes foram eleitas e duas chegaram à presidência da casa: Nélida Piñon e Ana Maria Machado, conhecida por sua vasta obra infantil.

Com que história contada aqui você se identificou mais? Quem é a mais inspiradora destas mulheres? Queremos saber sua opinião nos comentários!

Imagem de capa Lea Campos / Facebook

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