Por que o início da fase adulta passou para os 30 anos e quais são as consequências dessa mudança?

Psicologia
há 1 ano

Você já deve ter ouvido falar em termos como baby boomers, geração X, millenials e geração Z. É assim que os especialistas classificam as gerações, de acordo com seu comportamento em relação a temas como família, consumo, mercado de trabalho e outros. A classificação varia de autor para autor, mas, em geral, segue alguns padrões. As pessoas que fazem parte da geração dos baby boomers, por exemplo (nascidas no pós guerra), aos 25, 30 anos de idade já criavam seus filhos, discutiam questões políticas e ouviam música clássica.

Mas os chamados millennials (geração nascida após 1995), mesmo com seu desenvolvimento intelectual e independência financeira, pelo menos até os 30, 35 anos, estão à procura de seu “eu interior”, vivem em apartamentos alugados e dizem em voz alta: “É assim que provavelmente os adultos fariam”. Por que os jovens de hoje continuam sendo crianças crescidas e por que a passagem para a vida adulta se tornou algo relativo até os 40 anos de idade?

Incrível.club decidiu analisar em detalhes as razões deste fenômeno aperentemente nem um pouco acidental.

Atenção: note que, se aos 21 anos, você já é pai, tem uma família grande, possui um negócio próspero, tem 3 diplomas e não é um geek, não se apresse em protestar. Leve em consideração que tudo tem suas exceções e que as escolhas são suas e de mais ninguém.

1. A abertura de uma nova etapa no desenvolvimento humano

Vamos rever os dados históricos: até o início do século XX não havia o período chamado adolescência. Até os 17 anos de idade, as pessoas eram consideradas crianças e, na noite de seu aniversário de número 18, recebiam um pesado presente: a responsabilidade de formar uma família e os desejos de uma independência financeira imediata.

Apenas em 1904, graças ao trabalho científico do psicólogo alemão G. Stanley Hall intitulado “A adolescência”, a comunidade mundial começou a pensar, pela primeira vez, nesse fenômeno. Foi Hall quem descreveu a adolescência como um período de “tempestade e tensão”, acrescentando ao estudo diagramas ilustrados sobre as mudanças dos graus de tristeza e a rebeldia típica da idade. Só então os adolescentes começaram a ser vistos não como seres preguiçosos e rebeldes, mas como pessoas “que estão passando pelo espinhoso processo do amadurecimento”.

Teoricamente, o período compreendido entre os 20 e 30 anos ou mesmo 35 anos (ao que chamaremos de idade adulta prematura) também pode ter características problemáticas próprias, se estudarmos com mais detalhes o lado psicológico e emocional desse segmento. No século XX, todos concordavam que os adolescentes não eram adultos. Talvez no século XXI descubram que o início da idade adulta não significa realmente...o início da vida adulta.

Por exemplo, neste ano, os cientistas já se expressaram sobre a necessidade de colocar um novo limite para a adolescência, os 24 anos. Mas ainda há muito a ser estudado.

2. A expectativa de vida aumentou

No início do século XX, a esperança de vida era em média de 40 aos 50 anos de idade. Claro que, com uma expectativa de vida de, digamos, apenas 45 anos, seria um pouco estranho tentar se encontrar até os 35 anos. Nesse caso, não havia tempo a perder, a eficiência era sinônimo de sucesso na vida.

Hoje, em muitos países desenvolvidos, a expectativa de vida é superior a 80 anos. Então por que não deixar que as pessoas de 20 a 30 anos experimentem as inúmeras opções de trabalho, antes de encontrar aquela a qual se dedicará nos próximos 50 anos?

E, prevendo a sua resposta de que nem todas as pessoas conseguem viver até os 80 anos, concordamos com o fato de que a vida é sempre imprevisível. A qualquer momento, pode ocorrer um acidente, e ninguém é capaz de prevê-lo.

3. O mundo não está parado

Aqui há vários aspectos distintos:

  • O primeiro e o mais notável é que vivemos em um período relativamente pacífico. Os jovens não precisam se tornar pessoas instantaneamente hiper-sérias.
  • Nas famílias modernas há muito menos crianças. Tendo apenas um filho em vez de dois ou três, por exemplo, os pais podem dedicar mais tempo e recursos a essa criança. E os filhos acabam vivendo mais tempo com os pais. Por exemplo, de acordo com as estatísticas, um terço dos jovens americanos de 20 a 30 anos vivem com os seus pais. Até mesmo um dos atores do filme aclamado pela crítica Pantera Negra, Michael B. Jordan, de 31 anos, vive com sua mãe e seu pai e não sente nenhuma vergonha disso.
  • Nossa sociedade está se tornando cada vez mais complexa. E, portanto, é necessário de mais tempo para entende-la. Antes, se nascesse em uma família de ferreiro, você se tornaria um ferreiro. Hoje tudo é mais complicado. Você pode fazer um teste de DNA super soficiticado para verificar seus talentos natos, mas provavelmente esse será um método padrão acessível somente para a geração Z, nascida depois de 2000.
  • A globalização é um fenômeno que surgiu recentemente no cenário mundial e que já produziu seu efeito: os jovens foram infectados pela filosofia da liberdade, independentemente de sua cultura. Evidentemente, nenhuma tradição consegue superar a Internet. Como resultado, o padrão de pensamento do “millenial comum” é o mesmo em todos os lugares, de Los Angeles a Shenzhen, passando por Goiania.
  • Devido ao enfraquecimento das normas religiosas e morais, da aceitação do sexo antes do casamento e da convivência extraconjugal, os jovens não têm pressa em se casar. Além disso, a acessibilidade aos contraceptivos, a legalização do aborto em alguns países e lugares e o surgimento do movimento “childfree”, que sugere às pessoas não terem filhos, também tiveram um papel negativo em relação ao casamento. Hoje em dia, nos países mais desenvolvidos, o primeiro casamento é comemorado não antes dos 32 anos de idade (você pode obter mais informações sobre isso aqui).

4. Os jovens estão saturados da vida

Devemos reconhecer que a juventude moderna não tem muita vontade de viver aventuras. Muito provavelmente, isso é mérito da supersaturação dos meios de comunicação e da ausência de proibições estritas. Seja como for, as consequências são estas:

  • Ao contrário da geração de seus pais, os millennials têm muito menos sede pelo mundo do crime (ao menos nos países desenvolvidos). Os gangsters do passado ficariam decepcionados com a juventude de hoje, cuja taxa de criminalidade caiu para os níveis mais baixos (especificamente na Grã Bretanha e no País de Gales) pela falta de interesse dos millennials no assunto. Leia aqui um artigo completo sobre o tema.
  • A nova geração está arrefecida sexualmente. De acordo com um estudo realizado pelo The Next Steps, um em cada 8 millennials britânicos continua virgem aos 26 anos. E isso é resultado de uma cultura hiperssexualizada e da proliferação dos relacionamentos virtuais, os quais, de acordo com os futuristas, dentro dos próximos 10 a 15 anos, mudará completamente a forma de se relacionar sexualmente (uma referência à série “Black Mirror”).
  • O indicador do número de jovens que deseja tirar carteira de motorista diminuiu consideravelmente. Mesmo em relação a 2001, caiu de 77% para 66%. Parece que usar o Uber é mais barato do que manter um carro próprio.
  • O nível de gravidez na adolescência nos EUA também caiu “espantosamente”: mesmo em comparação a 10 anos atrás, os números atuais são quase 2 vezes menores.

5. Sensação de oportunidades

Jeffrey Jensen Arnett, professor de psicologia na Clark University (Massachusetts, EUA), marca a noção de “senso de oportunidades” inerente à juventude do século XXI. É uma impressão de insegurança em relação ao futuro, combinada com o sentimento otimista de possíveis oportunidades.

Ou seja: um trabalho das 9 horas às 18 horas; um Renault Logan; ótimas reuniões de família, mas brigas constantes com a esposa e com as crianças; almoço familiar nos finais de semana; férias uma vez ao ano; tudo isso é considerado ’o destino dos outros, não o meu’. Segundo um jovem entre 20 e 30 anos. “Sou único e serei o segundo Elon Musk deste Planeta” — numa referência ao magnata descolado do mercado de foguetes. Mas todos esses únicos “Elons Musks” têm, ao mesmo tempo, muito medo do futuro e não possuem planos claros de conquistar o mundo; são um tipo de maximalista complexado. Essa é a diferença em relação a seus pais, que sabiam o que os esperava no futuro e seguiam em direção ao seu objetivo.

Qual é o resultado de tudo isso?

Todas as razões e as mudanças mencionadas nos levam ao fato de que, hoje em dia, temos os seguintes modelos de vida adulta alternativos (claro, se não levarmos em conta os numerosos seguidores da maturidade paterna padrão):

  • Os kidults (do inglês kid- criança, e adult — adulto) são jovens de 20 a 30 anos de idade, pessoas auto-realizadas com passatempos bastante adolescentes, como o fantasy, o videogame Dota e “Os Simpsons”. Eles podem fazer uma apresentação brilhante em uma conferência sobre energia nuclear usando memes, ou sair para dançar techno house, depois de um dia duro de trabalho. Em geral, são pessoas de sucesso com passatempos bem juvenis.
  • Downshifters (do inglês downshifting, isto é, desaceleração do processo) são pessoas que buscam e não conseguem encontrar “seu verdadeiro eu”. Conseguem trabalhar todos os meses em lugares diferentes e em áreas que vão da pesca à pintura, entrar em uma seita e mudar para uma cidade distante.
  • Juventud NEET (do inglês Not in Employment, Education or Training, isto é, aqueles que não estudam nem trabalham, que, em português, se convencionou chamar de ’nem-nem’) são aqueles jovens que, como você já entendeu, não estudam nem trabalham devido à sua condição (algo escolhido) de não ter recursos ou formação para conseguir um emprego; ser anti-social, fechado , passivo ou desiludido em relação à vida e impossibilitado de realizar seu potencial sobrenatural (provavelmente criativo) nas condições completamente injustas de hoje.

Devemos fazer algo em relação a isso?

A psicóloga clínica Meg Jay, em sua apresentação no site de conferências TED, falou dos “recém adultos” que chegam às suas sessões reclamando, desapontados, por terem perdido uma década inteira de suas vidas.

Ela fala sobre 3 coisas que todos que hoje têm pouco mais de 20 anos deveriam saber, para evitar ter de repensar sobre sua decepcionante vida aos 40 anos:

1. Devemos nos esquecer da crise de personalidade e trabalhar o capital pessoal (ou seja, aprender coisas novas, aumentar nosso valor). Claro que você pode passar essa década buscando por seu eu. Mas devemos diferenciar uma busca de uma procrastinação banal.

2. Não limite seu círculo social. Novas pessoas, amigos de amigos dos nossos amigos podem ser muito úteis na vida. Por exemplo, metade das vagas de emprego não são publicadas em sites ou no LinkedIn. Portanto, para conseguir um emprego, você deve entrar em contato com o chefe do vizinho, por exemplo. Não é trapaça. É um fato da propagação da informação.

3. Aos 30 anos. Quando de repente você percebe que todos os seus amigos do Facebook já estão se casando, procurar a primeira opção disponível para se casar não é uma boa ideia. Você tem de começar a construir um relacionamento matrimonial antes do casamento. Isso significa que o amor deve ser buscado com a mesma determinação que um trabalho.

Então a conclusão

Os jovens de 20 anos de hoje em dia são iguais aos jovens dessa idade há 50 anos, apenas as condições são diferentes. E o ser humano, como sabemos, é uma criatura muito adaptável, é por isso que hoje temos uma geração tão incomum de millennials. Não se culpe por esse comportamento, nem a você, nem a seus filhos ou parentes, é melhor simplesmente mostrar-lhes a apresentação de Meg Jay (sobre quem escrevemos anteriormente) e, com um olhar misterioso parecer dizer: “Entendo tudo” e relaxar, por favor!

Para você, a que consequências essa tendência de amadurecimento tardio levará? Aguardamos suas opiniões nos comentários.

Imagem de capa wikipedia, thechive

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