“Minha esposa parou de progredir”. Um texto incisivo sobre como algumas pessoas colocam o rótulo de “preguiçosa” em mulheres injustamente

Psicologia
há 3 anos

Comecei a notar que ao arsenal das queixas habituais sobre as esposas — “ela engordou”, “ela só me enche a paciência”, “ela envelheceu” e “ela só sabe gastar o meu dinheiro” — foi adicionada mais uma: “minha mulher parou de se desenvolver”. Essa reclamação surge em versões distintas dependendo do tom usado pelo cônjuge indignado. A seguir, descreverei uma das possíveis situações.

A criança está com quase um ano, e a mulher está acima do peso, cansada e com olheiras. Ela não lê muito, assiste a programas sem conteúdo em vez de matérias interessantes e praticamente não se cuida. Os interesses dela se restringem às conversas nos fóruns “das mamães”, que discutem com total seriedade sobre como tratar espirros com suco de aloe vera e sobre a cor das fezes dos bebês. Ela não tem mais tempo para seus hobbies e atividades habituais, tampouco para a academia ou para a piscina. A esposa está “estragada” — é hora de encontrar uma nova.

Veja como isto é interessante. Aos olhos do marido, a mulher está se deteriorando e pausou o próprio desenvolvimento pessoal. No entanto, se observarmos mais de perto, vemos que frequentemente é a mulher que toma para si a maior parte dos problemas associados ao bebê.

Ao dar à luz, uma nova mãe precisa amadurecer drasticamente e aceitar o fato de que será preciso abdicar de muitos passatempos e muitas atividades por um determinado período. O cônjuge, por outro lado, permanece no mesmo nível em que estava: age como uma criança ao não compreender por que os recursos, o tempo e os interesses individuais diminuíram em número e por que ele deve compartilhá-los com o novo integrante da família. A pergunta que deve ser feita é: qual deles não está evoluindo?

A segunda situação. O marido reclama: “Outras mulheres, em licença-maternidade, fazem manicure em domicílio, escrevem textos para blogs, fazem extensões de cabelo para conhecidas. Em outras palavras, ganham dinheiro. Já a minha, não quer saber mais da carreira e, como resultado, preciso sustentar minha família sozinho”.

Essa é uma tendência dos últimos anos, fortemente associada ao desejo das mulheres de se tornarem independentes e à incapacidade de muitos homens, com salários medianos, de permanecerem os provedores únicos de renda familiar. Por isso, mesmo que haja oficialmente a possibilidade de se manter na licença-maternidade por um bom tempo, diversas mulheres optam por voltar a trabalhar apenas algumas semanas após o parto, buscando obter alguma fonte de renda, mesmo que pequena.

Por um lado, eu apoio essa decisão caso a criança esteja saudável, não exija atenção excessiva e tenha boa imunidade. Contudo, não acho correto exigir que cada mãe siga o mesmo caminho. Muitas crianças adoecem com facilidade ou precisam de cuidados especiais, por exemplo. Certas mães, também, precisam de mais tempo para a própria reabilitação. Uma pergunta: por que a mulher (que deve se tornar uma super-heroína, com um filho na mão e um trabalho na outra) deve ser a única que precisa progredir? E por que o parceiro não pode tentar encontrar um emprego com melhor remuneração caso a sua renda não seja suficiente?

A terceira situação. O marido bem-sucedido, que cresceu bastante na carreira, agora quer se divorciar da esposa, que se manteve ao lado dele desde o começo — desde quando ele “estava por baixo”.

Li um caso sobre um homem bastante famoso, que conseguiu alavancar a carreira enquanto a esposa lavava pisos de apartamentos. Ela sempre acreditou no potencial dele e o apoiou. Ela estava certa, o homem realmente alcançou a fama. No entanto, ao “subir na vida”, ele trocou a esposa por uma nova mulher, pois não queria estar associado a uma faxineira.

Qual foi o ponto de vista do marido? O homem pensa que a mulher se desgastou, envelheceu e não evoluiu como ele. Ela não pode fazer mais nada por ele, não pode mais ajudá-lo. Isto é, ela perdeu a relevância, como se fosse uma bota velha, que não dá mais para ser usada.

O que realmente aconteceu? Na minha opinião, foi violado um acordo subentendido entre os cônjuges, aquela mesma “barganha patriarcal”, que garantiria às mulheres benefícios após elas se acomodarem às normas patriarcais. Ou seja, se se comportarem bem durante a juventude, receberão respeito e consideração no futuro. Sim, o marido realmente cresceu na vida. Mas a minha pergunta é: ele conseguiu isso sozinho?

Na frase “minha esposa parou de progredir”, me parece ser muito importante esclarecer por quem ela está fazendo isso. Uma coisa é se o parceiro está disposto a gastar tempo e dinheiro nesse período de adaptação. Contudo, se ele age com falta de consideração, como na primeira situação; se tenta ser “espertinho”, como na segunda; ou se simplesmente não se importa mais com a esposa, como na terceira, então a história é completamente diferente.

Incrível.club publica este texto com a permissão da autora e blogueira Morena Morana.

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