Como alguns modelos de ensino limitam a liberdade do aluno (e algumas maneiras para mudar isso)

Psicologia
há 2 anos

escola é o primeiro ambiente no qual conhecemos de verdade como funciona o sistema educacional. Infelizmente, para muitas pessoas, esse primeiro encontro deixa lembranças desagradáveis: decorar sem entender, preencher mapas geográficos e escrever redações sem poder, de verdade, expressar a própria opinião. Isso considerando o fato de que é a escola que deveria estimular justamente o interesse pelos estudos e o pensamento crítico.

Nós, do Incrível.club, refletimos sobre o que pode estar errado em alguns modelos escolares e por que os professores costumam limitar a liberdade do aluno.

Por que as crianças não estão interessadas em aprender?

Em 2004, o instituto Gallup realizou uma pesquisa entre adolescentes. Os estudantes precisaram escolher algumas palavras que associavam à escola. As respostas mais frequentes foram “tédio” e “fadiga”. Esse resultado é triste, não é? Por que o lugar onde uma criança passa a maior parte do tempo provoca mais sentimentos negativos do que positivos?

Uma das razões mais importantes para essa atitude é que as crianças simplesmente não entendem por que estudam certas matérias. É difícil se interessar por algo que parece ser inútil. Muitos professores nem tentam explicar a importância de uma matéria para a vida real. Portanto, o processo de aprendizagem se transforma, de um encontro fascinante com novos conhecimentos, em uma ’decoreba’ mecânica.

Muita teoria, pouca prática

Provavelmente, muitas pessoas se lembrem da decepção de quando, ainda estudantes, chegaram à aula de Química e, em vez de experimentos interessantes, precisaram ler muitas páginas de teoria enfadonha. Esse foco na teoria ao invés da prática fez com que muitos alunos não se interessassem pela aprendizagem nas décadas passadas. E hoje, quando cada estudante tem um smartphone no bolso com vídeos curiosos e jogos eletrônicos dinâmicos, é ainda mais difícil manter alunos focados.

Se no passado um aluno tinha de estudar com atenção um livro para preparar uma apresentação, agora os estudantes obtêm a informação desejada em apenas dois cliques. E isso está prejudicando o desenvolvimento do pensamento crítico, pois o objetivo da aprendizagem resume-se à simples repetição dos fatos achados com a ajuda do Google. E é tão fácil esquecer essa informação inútil quanto encontrá-la. Para as crianças terem a vontade de se aprofundar em um assunto, é necessário que um professor moderno crie um ambiente em que cada aluno possa aprender uma matéria de modo individualizado. Para alguns isso significa participar de um debate; para outros, fazer um desenho. Para outros, ainda, o que funciona é ler em voz alta e interpretar papéis de personagens — para aprender História ou Literatura, por exemplo.

“Ninguém se importa com sua opinião”

“Ninguém perguntou sua opinião! Você opina demais!”

Infelizmente, muitos professores de hoje permanecem fiéis aos postulados desatualizados de ensino, em que o professor é uma figura estritamente autoritária e o cumprimento formal do cronograma de aulas se torna mais importante para os alunos do que um ímpeto sincero de explorar um assunto.

É indesejável discutir com um professor ou ter sua própria opinião nessas circunstâncias. A única coisa que um estudante deve fazer, então, é concordar com o raciocínio do professor. Se o tema da redação diz “Katerina é um raio da luz em um reino escuro”, então, ela é “um raio da luz” mesmo e ponto final (Obs. trata-se da peça de Alexandre Ostrovski ’Tempestade’). Qualquer tentativa de interpretar livremente a matéria pode resultar em reprovação.

Galina Józefovich, crítica literária e professora russa, acredita que não podemos saber exatamente “o que o autor queria dizer”, mas podemos tentar interpretar um texto. Segundo ela, o importante é ser capaz de argumentar. Em vez disso, milhões de estudantes continuam recitando opiniões dos outros nas suas redações e não aprendem a justificar o próprio ponto de vista.

  • Minha mãe foi testemunha de uma cena absurda no colégio. Meu colega tirou uma nota baixa por expressar sua opinião na redação. A mãe dele veio falar com a professora de Literatura. Ela disse: “Mas a criança pode ter sua própria opinião!” A professora respondeu: “Pode, mas ela não deve ser diferente da convencional”. Essa frase virou um ditado. © PivBear / Pikabu

A forma é mais importante do que o conteúdo

“A mãe comprou cinco pacotes de sal. Dois pacotes foram comidos no almoço. Quantos pacotes de sal sobraram?”

Basicamente, muitos educadores focam no desempenho formal da tarefa, e não na essência. Assim, a pesquisadora de Ciências Psicológicas Lyudmila Yasukova, autora de numerosos trabalhos sobre de educação e desenvolvimento de crianças em idade escolar, diz que a leitura de “compreensão de símbolos gráficos” se tornou a “verbalização de símbolos gráficos”. Ao testar a fluência na leitura, os professores focam na velocidade e expressividade, enquanto o significado da escrita permanece incompreendido para a criança.

O mesmo problema é encontrado em outras matérias. As notas em Matemática, Física e Química, por exemplo, caem pelo fato de a letra ser feia ou a resposta, “mal formulada”.

  • Uma vez, no colégio, nos deram como tarefa preparar uma apresentação de Biologia nas férias de verão. Passei o verão na casa da minha avó, longe de impressoras, bibliotecas e da Internet. Felizmente, ela tinha um ótimo livro sobre rosas. Copiei para um álbum à mão e desenhei ilustrações de espécies, pestes e doenças. No início do ano, todos meus colegas tiraram dez e eu tirei oito. A professora argumentou que todos haviam feito suas apresentações usando impressoras. E eu havia ficado com preguiça. © tanktayberry / Pikabu
  • Fui a uma aula na pré-escola. Perguntaram às crianças: “Se vocês estivessem na Idade da Pedra, com o que presenteariam as pessoas daquele período: máquina de lavar roupa, 50 reais ou guarda-chuva?” As crianças ’certas’ disseram ‘um guarda-chuva’ e um garoto disse ‘uma máquina’. A professora riu e perguntou como a ligariam. Não havia eletricidade! E o garotinho disse que a máquina de lavar tinha um monte de mangueiras e era de ferro, e não havia o ferro naquela época; portanto, o povo antigo poderia desmontá-la para tirar todas as coisas úteis e fazer ferramentas. A professora só sorriu arrogantemente, afirmando que as pessoas na Idade da Pedra nem teriam pensado nisso e que a resposta correta era um guarda-chuva. © SVIHO** / Pikabu

Treinar para obter uma nota alta

Há um problema lógico com o sistema de notas de zero a cinco. Dessas cinco possíveis, apenas duas são positivas e três negativas (praticamente nunca usam a nota um). Não há objetividade em uma diferenciação tão rígida.

Imagine que um aluno cometa 20 erros no ditado. Então, ele trabalha duro e, no próximo, comete só oito erros. E daí? Uma nota dois de novo! No entanto, seu avanço é muito maior do que o de um aluno ’ótimo’ que, tendo corrigido um único erro, passou de uma nota quatro para cinco.

Segundo o renomado professor Zitser, fundador do Instituto de Educação Informal e da Escola de Educação Informal “Laranja”, a motivação para tirar boas notas muitas vezes substitui todos os outros incentivos, incluindo o desejo básico de aprender. A criança perde a capacidade de fazer perguntas e de escolher o que gosta, mas aprende a viver de acordo com as expectativas dos adultos.

Os especialistas dizem que o desenvolvimento do pensamento crítico requer o mesmo tempo de esforço exigido para se formar um atleta profissional ou um músico: aproximadamente 10 mil horas. É claro que nenhuma escola pode gastar tanto tempo para desenvolver a capacidade de raciocínio. Mas quantas horas uma escola gasta para elevar as notas a uma norma efêmera e preparar estudantes para os testes do ENEM? Que habilidades essa prática desenvolve?

Por que aprender a pensar criticamente?

Hoje em dia, diante de uma assustadora abundância de informações, é especialmente importante os alunos serem capazes de pensar criticamente: para verificar os fatos, para atestar a autenticidade de certas situações, para identificar falsificações, para olhar para situações de diferentes ângulos, para fazer perguntas desconfortáveis e para exigir respostas. As pessoas que aprenderam que “há apenas uma opinião correta e é necessário lembrá-la”, muitas vezes não sabem analisar informações e acreditam em qualquer notícia.

Para uma criança aprender a pensar e analisar, é necessário criar um espaço de investigação, deixá-la estudar o assunto não apenas decorando os fatos, mas também usando meios não convencionais. De acordo com especialistas, a chave para a aprendizagem é brincar. Esse formato ensina as crianças a fazer perguntas, a expressar-se, a cooperar com os outros e a assumir riscos criativos, em vez de perseguir notas altas e adaptar-se às expectativas dos adultos.

Você acha que a escola pode ensinar uma criança a pensar criticamente ou que essa missão recai inteiramente sobre os ombros dos pais? Comente.

Imagem de capa SVIHOEB / Pikabu

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há 2 anos
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