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A verdadeira história por trás de “Eu, Tonya”, um filme para o qual Margot Robbie foi indicada ao Oscar
Em 1994, um acontecimento inédito abalou o mundo da patinação artística, transformando a americana Tonya Harding na “maior vilã da história do esporte nos Estados Unidos”. O escândalo, paradoxalmente, fez aumentar a popularidade da patinação. Tonya, no entanto, nunca mais se recuperou e não conseguiu voltar a patinar profissionalmente.
O filme Eu, Tonya, de 2017, baseou-se na história da patinadora, papel interpretado por Margot Robbie, e recebeu várias indicações ao Oscar, incluindo o de melhor atriz. O Incrível.club decidiu pesquisar os fatos por trás do longa e deseja compartilhá-los neste post com vocês, leitores.
Uma mãe com um coração de pedra
Considerada vilã por muitas pessoas e heroína ou vítima por outras, Tonya Harding é, sem dúvida, uma personagem típica da cultura americana, como mostraremos a seguir. Infelizmente, seus sucessos obtidos com a patinação artística foram ofuscados por um incidente que marcaria a sua vida para sempre.
Tonya Maxene Harding (esse é seu nome completo) nasceu em Portland, Oregon, em 1970, filha de LaVona Golden e Albert Gordon Harding. Aos quatro anos de idade começou treinar patinação artística com a instrutora Diane Rawlinson, demonstrando grande potencial.
Além de passar muitas horas na pista de gelo, Tonya estudava mecânica de automóveis e costumava caçar com o pai. Sua mãe, LaVona, era garçonete e financiou todas as aulas de patinação de Tonya, além de costurar todos os trajes de competição. LaVona era uma mulher de personalidade forte e muito exigente com a filha quando se tratava de patinação. Era comum, por exemplo, bater na garota se ela cometesse algum erro durante os treinos.
Quando os pais se separaram, Tonya ficou com a mãe, mas o relacionamento entre elas não era bom. A patinadora chegou a declarar que nunca se sentiu amada por LaVona e que desde pequena foi vítima de abusos físicos e psicológicos. Sua treinadora, Diane, sabia desses abusos, mas não fazia nada a respeito, porque “acreditava que a patinação era um jeito de ela fugir da lama. Além disso, se Tonya tivesse sido mandada para outra família, teria perdido a patinação”.
Tonya Harding e a sua treinadora, Diane Rawlinson
Em 2008, Tonya revelou em sua biografia autorizada (The Tonya Tapes) que, na juventude, foi vítima de abuso sexual por parte de seu meio-irmão, Chris Davidson, em várias ocasiões, e que, em 1991, viveu uma situação semelhante com um “amigo”, mas preferiu não dizer seu nome.
Sucesso na patinação
Tonya estava tão envolvida com a patinação que abandonou o ensino médio para se dedicar exclusivamente ao esporte — mais tarde conseguiu um certificado de equivalência, obtendo, assim, a graduação. Aos 15 anos, começou um relacionamento com Jeff Gillooly, dois anos mais velho do que ela. Jeff sempre esteve muito envolvido com a carreira de Tonya e, em 1990, quando ela tinha 19 anos, se casaram.
Cada vez mais focada, Tonya ia se destacando no esporte. Em 1990, já era uma das favoritas à conquista do Campeonato de Patinação Artística dos Estados Unidos. Mas a asma e o fato de não ter a aparência ideal de uma patinadora artística americana pesaram contra ela nessa ocasião.
Seu grande momento chegou em 1991, ao se tornar a primeira americana a completar um Axel triplo (e a segunda no mundo), um salto com três voltas e meia para trás, que envolve um alto grau de complexidade, obtendo a nota seis por mérito técnico, algo que não se via desde 1973.
Naquele ano, venceu o Campeonato dos Estados Unidos e ficou em segundo lugar no Mundial, dividindo o pódio com suas compatriotas Kristi Yamaguchi, em primeiro lugar, e Nancy Kerrigan, em terceiro.
Apesar do sucesso profissional, seu casamento era um pesadelo. Jeff era um homem violento e inclusive uma vez atirou nela, mas a bala ricocheteou no chão, acertando-a no rosto (ele nega a acusação). Em 1993, Tonya decidiu deixá-lo e se divorciaram.
O início de uma rivalidade perfeita
A ascensão de Tonya não foi fácil. Tecnicamente, ela era perfeita. Tinha um estilo livre e poderoso e seu vigor era notável. No entanto, sua franja rebelde e suas roupas confeccionadas pela mãe, bem como seus músculos desenvolvidos e suas atitudes consideradas pouco femininas não cativavam nem os juízes nem os patrocinadores.
Do outro lado da história estava a patinadora Nancy Kerrigan, que se tornava a cada competição mais popular. Nancy tinha um corpo perfeito, era esbelta e seus movimentos eram graciosos. A princesa de uma história em que Tonya parecia não ter papel, a menos que se tornasse vilã.
Em 6 de janeiro de 1994, a história atingiria o clímax, quando Nancy foi atacada após um treinamento, sendo atingida diversas vezes acima do joelho direito por um bastão retrátil. A intenção parecia óbvia: impedi-la de participar das competições nacionais e das Olimpíadas de Inverno em Lillehammer, na Noruega.
Os responsáveis pelo ataque estavam longe de ser bandidos profissionais e cometeram diversas “trapalhadas”: se hospedaram com seus nomes verdadeiros em um hotel antes do crime e os seus cartões de crédito deixaram um rastro fácil de seguir. Foram necessários apenas dois dias para serem presos. Eles faziam parte de uma gangue que se autodenominava “The Hit Team”, liderada por Shawn Eckardt, que, inclusive, fazia questão de dizer a todos que estava por trás do ataque.
Eckardt era amigo de Jeff, o ex-marido de Tonya; com isso a polícia e a mídia facilmente “adivinharam” o restante da história. Todos os envolvidos, incluindo o seu ex-marido, acusaram Tonya de ser a verdadeira mentora por trás do ataque.
Rumo às Olimpíadas
Tonya Harding e Nancy Kerrigan treinando na Noruega
Seja como for, enquanto a investigação policial estava em andamento, Nancy se recuperava de seus ferimentos, ao mesmo tempo em que Tonya vencia o Campeonato Nacional e se classificava para os Jogos Olímpicos de Inverno. No entanto, o comitê responsável decidiu que, embora Nancy não pudesse estar na competição de qualificação, ela teria garantido um lugar na disputa olímpica.
Faltando um mês para Tonya e Nancy ficarem frente a frente nos Jogos, a história já havia se transformado em um circo midiático. A imprensa ficava a postos do lado de fora da casa das duas patinadoras, esperando por alguma declaração. Os jornalistas as seguiam por onde quer que fossem. Enquanto Nancy se preparava em pistas de patinação particulares, Tonya tinha de treinar em pistas gratuitas de shoppings, pois nesse momento, praticamente não havia interesse de patrocinadores.
Com o escândalo em pleno auge, o Comitê Olímpico Americano sugeriu que Tonya se retirasse voluntariamente da competição, mas ela não estava disposta a renunciar e respondeu com um processo de 10 milhões de dólares (o equivalente a 51 milhões de reais). A patinadora não recebeu o dinheiro, mas participou das Olimpíadas, pois não tinha sido formalmente acusada.
O público americano estava ansioso pelo encontro de Tonya com Nancy na competição, transformando esse momento no terceiro evento esportivo mais assistido na história do país. Elas não dirigiram a palavra uma a outra. Nancy brilhou em sua participação e ganhou a medalha de prata (embora muitos afirmassem que merecia a de ouro), enquanto Tonya mal conseguiu o oitavo lugar, depois de uma participação um tanto conturbada, em que teve de recomeçar por causa de um problema com o cadarço.
Ao retornar aos Estados Unidos, Tonya foi considerada culpada por obstrução da Justiça e confessou que não sabia dos planos para atacar Nancy, mas que, dias após o episódio, descobriu que o seu ex-marido estava envolvido. Ela havia escondido esse fato da polícia porque ele a ameaçara.
Além de pagar uma multa e prestar serviços comunitários, a patinadora teve retirado seu título de campeã nacional de 1994 e ainda foi declarada persona non grata pela Associação de Patinação Artística dos Estados Unidos. Aos 23 anos foi proibida de competir profissionalmente e de atuar como treinadora.
A vida depois dos patins
Distante da patinação, Tonya tentou a sorte em um novo esporte, tornando-se lutadora de boxe, mas depois de participar de algumas lutas, abandonou a modalidade. Ela também trabalhou como soldadora, pintora em uma fábrica de metais e vendedora em uma loja de departamentos. Em 2010, se casou com Joseph Price, com quem teve um filho chamado Gordon e hoje leva uma vida tranquila em Washington.
Em 2014 o roteirista Steve Rogers se interessou pela história de Tonya e quis contá-la a partir do seu ponto de vista. O diretor lhe ofereceu 1.500 dólares (o equivalente a 7.700 reais), para saber a sua versão — com a promessa de mais dinheiro se o filme fosse produzido. Dessa forma Tonya retornou aos holofotes com a estreia do longa em 2017.
A própria Tonya descreveu o filme como “magnífico”. E não porque seja fiel ao seu relato, mas porque dedica um tempo para explicar a sua vida antes do ataque ocorrido contra a rival — mostrando, por exemplo, como a violência que sofreu primeiro por parte da mãe e depois do marido influenciou sua vida e sua carreira, além de retratar as frustrações em sua carreira.
Bônus: os personagens de Eu, Tonya
Tonya Harding atualmente
Jeff Gillooly
LaVona Golden
Shawn Eckardt
O filme é muito fiel às imagens reais
Embora muita gente ainda discuta se, afinal de contas, Tonya foi culpada, inocente ou simplesmente uma vítima das dificuldades da vida, o fato é que o filme, mesmo com suas licenças poéticas, é uma excelente produção. Você conhecia esse caso? Qual sua opinião sobre Tonya e sua história?