A história do homem que inventou todos os truques dos shopping centers modernos, que depois de 100 anos continuam sendo eficientes

Curiosidades
há 4 anos

Harry Selfridge transformou o passeio para fazer compras em um verdadeiro prazer, dando às pessoas a oportunidade de que se divirtam e passem o dia em um comércio, lugar que às vezes é mais aconchegante e luxuoso que suas próprias casas. Ele criou um sistema para fazer compras no formato que conhecemos hoje: descontos, promoções, a abordagem de “o cliente tem sempre razão”, vitrines atraentes e a oportunidade de simplesmente matar a curiosidade sem adquirir nada.

No Incrível.club lemos a biografia do criador das redes de lojas Selfridges, que foi escrita por Lindy Woodhead, e queremos compartilhar essa história excepcional com você.

Como era o comércio no início do século XX

Galeria comercial coberta: uma das precursoras dos shopping centers.

Na véspera dos séculos XIX e XX, as lojas eram frequentadas apenas por pessoas de certa classe social. Além disso, os funcionários não eram muito amigáveis com os clientes e os preços dependiam do humor do proprietário.

Certa vez, Harry Selfridge teve um breve diálogo com uma pessoa que trabalhava em uma loja:

—"Planeja comprar alguma coisa, senhor?“, perguntou o atendente.

— “No momento não, estou apenas olhando”.

— “Então saia daqui, amigo!”

Essa conversa permaneceu gravada para sempre em sua memória. Vinte anos depois, Selfridge abriu um shopping em Londres, no qual não havia administrador, preços exorbitantes ou grosseria, e o comprador tinha o direito exclusivo de dizer: “Estou apenas olhando”.

O que Selfridge criou

Harry Selfridge, 1910.

Harry Gordon Selfridge nasceu em 1858, nos Estados Unidos. Após a guerra civil, seu pai se aposentou do exército, mas não voltou para sua família. Lois Selfridge, que perdeu o marido e dois filhos, mal conseguia pagar as contas da casa trabalhando como professora. Diante dessa situação, aos 10 anos Harry começou a trabalhar para ajudar a mãe.

Selfridge abriu seu shopping center em Londres em 1909, depois de ter trabalhado por 25 anos no comércio americano. Era uma construção de 24 mil metros quadrados: um projeto inédito para um momento em que as lojas ocupavam, no máximo, o primeiro e o segundo andares dos edifícios, e as senhoras vestidas com roupas pesadas não tinham a menor motivação para subir escadas com o objetivo de adquirir fitas de cetim.

Isso foi o que Harry Selfridge idealizou e realizou: criou uma loja onde as pessoas quisessem ficar mais tempo. Os shoppings, como os conhecemos agora, começaram com as grandes lojas da Selfridges. Nelas havia um toalete para senhoras, uma área para crianças, um café, elevadores, uma biblioteca com jornais recentes, uma ’sala de silêncio’, uma agência dos correios, comunicação por telefone e atendimento ao cliente. Naquela época, encontrar um banheiro feminino e não se sentir oprimida era difícil, por isso as senhoras tinham que, por exemplo, tomar uma xícara de chá ou café em um hotel nas proximidades apenas para usar o banheiro.

  • Selfridge se baseou no serviço multifuncional. Os clientes podiam ir a um centro médico, a uma casa de câmbio, cortar o cabelo, fazer manicure e pedicure, guardar suas coisas temporariamente em salas especiais e continuar comprando. A central de informações do shopping center atendia cerca de 40 mil ligações por dia.

No local, também era possível comprar um bilhete para o metrô. Selfridge ajudava as pessoas a economizarem tempo para poder fazer compras.

  • Destruiu os estratos sociais. A Selfridges tornou seu centro comercial um lugar acessível a todos os grupos sociais. Pela primeira vez, uma mulher tinha o direito de aparecer em público para comprar algo para si mesma, e tinha a oportunidade de se divertir sem ter que esperar para ir, por exemplo, ao teatro. Naqueles dias, não havia muitos estabelecimentos que uma senhora pudesse frequentar sem estar acompanhada. Selfridge teve a ideia de abrir uma salão de chá que foi muito procurado. A propósito, o negócio ficou a salvo dos ataques e tumultos causados pelas sufragistas porque o próprio Harry Selfridge apoiava abertamente esse movimento de luta. Portanto, ninguém danificou nem mesmo uma única vitrine do seu estabelecimento.
  • Organizou as primeiras vendas com um desconto de 50%. Tais ofertas se tornaram uma revolução. A ideia gerou um lucro de mais de 3 milhões de dólares, que vinham justamente da categoria de clientes com quem ninguém queria trabalhar até então: pessoas com recursos limitados e com a necessidade urgente de adquirir um bom terno para passear. A ideia começou a ser incorporada por outros varejistas. Talvez o princípio do autosserviço tenha sido gerado precisamente aqui.

“Roupas pela metade do preço”. Vendas de Natal na Selfridges, 1933.

  • Harry Selfridge atraía os compradores usando aromas. Ele adorava quando lhe davam flores, então decidiu transferir essa paixão para o seu negócio: pela primeira vez na história, a aromatização de ambientes começou a ser usada no comércio, com a pulverização de perfumes e colocação de flores frescas nos salões. Naqueles tempos de higiene precária, esse movimento foi muito acertado.
  • Ele usava a iluminação como forma de atrair clientes. Selfridge introduziu as “vitrines iluminadas” depois de ordenar que luzes tênues fossem deixadas acesas nas vitrines durante a noite. Desta forma, gerava um contraste entre seus salões, que eram atraentemente iluminados, e as lojas escuras, que não apresentavam tamanha sofisticação.
  • “Faltam... dias para o Natal”. Esse movimento publicitário também foi uma inovação sua, junto com os cartões de felicitações e a ideia de dar presentes aos clientes para ganhar sua lealdade. No dia da inauguração, todos os visitantes recebiam como presente uma pequena chave de prata, que os convidava a voltar ao shopping como se fosse sua casa.
  • Era indispensável fazer uma bela embalagem para todos os produtos. Segundo Selfridge, os clientes mereciam se sentir bem, independentemente do valor de suas compras. Portanto, cada produto da loja era embrulhado com um lindo pacote da marca.
  • Transformou as vitrines em obras de arte. A colocação das mercadorias dentro das vitrines estava a cargo de uma equipe independente de profissionais. Selfridge foi até acusado de “agradar os cleptomaníacos”: com demasiada frequência, havia tentativas de furto às peças em exposição. Algumas décadas depois, foi convidado a Cambridge para dar uma aula sobre a importância da decoração das vitrines.

A fachada de uma loja na época de Natal, década de 1930.

Décadas depois, o shopping permanece fiel ao conceito de design de vitrines, o que torna impossível não parar e olhar para elas. Londres, 2013-2014.

  • Alterou os princípios de colocação da mercadoria. Antes, os produtos eram colocados em prateleiras muito altas, e era impossível alcançar aqueles que estavam na parte de cima sem uma escada. Para ver algo, era necessário pedir ao vendedor para que pegasse e, depois disso, sentir-se condicionado a fazer a compra. Examinar de perto a mercadoria não era bem visto. Selfridge ordenou que as prateleiras fossem baixadas a uma altura conveniente para os clientes e que as mais altas fossem removidas para colocar os itens à venda em mesas e expositores.
  • Transformou a abordagem dos comerciantes em publicidade. Os donos de publicações amavam Selfridge porque ele criou uma nova fonte de renda para eles. Comprava anúncios de página inteira nos jornais para fazer publicidade, enquanto seus concorrentes estavam satisfeitos com pequenos anúncios de um quarto de página, sem entender por que deveriam gastar tanto dinheiro com isso. Harry até tentou comprar o Times, e talvez tenha sido o primeiro varejista a perceber todo o poder publicitário da Vogue. Tampouco desprezava anúncios em transporte público.

Sua perspicácia criava tendências

Uma imagem da série de televisão Mr. Selfridge.

  • Foi o primeiro a perceber o poder do rádio. Os jornais reagiram com ceticismo à aparição do novo veículo de comunicação. Foi Selfridge quem concebeu resumir o que poderia ser ouvido através dele. Ao resto da mídia só restou copiar o conceito. Claro, ele foi o primeiro a vender aparelhos de rádio.

Uma multidão se amontoou diante da Selfridges para olhar os aparelhos de rádio, em 1928.

  • Mantinha as contas de uma forma que causaria inveja a qualquer equipe de marketing. Ele conhecia todas as estatísticas sobre vendas, visitas e o perfil de seus compradores. Calculou que uma garçonete poderia dar 9 passos a mais por minuto vestindo calças do que com uma saia. Em um estabelecimento com diversas mesas, o conforto das funcionárias para se movimentar entre elas era um aspecto fundamental.
  • Foi um dos primeiros a perceber a importância da televisão e da robótica em geral. O criador da televisão, John Baird, foi considerado um louco pela mídia de Londres. No entanto, foi aceito com alegria no shopping center, onde até recebia para fazer exibições de sua “caixa falante”. A primeira exibição deste aparelho no mundo foi organizada na loja de Selfridge. Ele disse que “a televisão criaria uma conexão entre todas as populações do mundo”.

Em 1934, um robô exposto em uma loja atraiu uma multidão. Selfridge era um verdadeiro animador e sabia muito bem como entreter as pessoas.

  • Cuidado com a equipe de trabalho, algo inédito no início do século XX. A única coisa que o pessoal da loja não recebia era uma contribuição para a aposentadoria. No entanto, os funcionários desfrutavam de múltiplos benefícios: assistência médica e odontológica, ausência de sanções (era a única loja que não multava por não cumprir a meta de vendas), almoços em refeitórios, cabeleireiros, férias de esqui à custa da empresa. E festas, é claro.
  • As vendas eram um espetáculo encantador. Quando o primeiro avião apareceu, Harry convenceu o proprietário a permitir que ele o expusesse no shopping. Centenas de milhares de pessoas compareceram para ver a inovação e os espaços permaneceram abertos até a meia-noite. Sempre se organizava um espetáculo no terraço da Selfridges. Em uma ocasião, foi colocada uma pista de patinação no gelo, onde se apresentaram os campeões do esporte.

Bônus: dados interessantes sobre a personalidade de Selfridge

Foto de 1922. Durante esse período, o shopping center, em cujo sucesso poucas pessoas acreditaram inicialmente, trouxe bons lucros para seu proprietário. Selfridge até alugou o castelo de um lorde.

  • A única vez que ele perdeu a calma na presença dos funcionários foi quando descobriu que eles haviam informado mal os clientes sobre a qualidade de umas meias. Selfridge proibiu o uso de expressões ambíguas e sempre lutou pela honestidade com as pessoas.
  • Era obcecado com o tempo: não gostava de reuniões e longas conversas. Quando um visitante entrava em seu escritório, Harry virava uma ampulheta. Ele inaugurou seu negócio aos 51 anos, mas teria gostado de ter 30 anos na época.
  • A capacidade de trabalho de Selfridge era fenomenal. Ele sofreu um acidente e experimentou uma morte clínica. Quando acordou, depois de 40 horas em coma, afirmou que estava saudável e que queria ir trabalhar.
  • Winston Churchill disse: “A Grã-Bretanha vive com o princípio de que ’as coisas seguem seu próprio caminho’”. Esse é um lema que nasceu na Selfridges e que foi dirigido ao povo.

A única vez que Selfridge chorou diante de estranhos foi quando um míssil atingiu o telhado do shopping durante a guerra. Na época ele tinha mais de 80 anos, e foi convidado a deixar o cargo de diretor. Tudo o que lhe restava era olhar para a sua criação da janela do prédio da frente.

Harry Selfridge morreu em 8 de maio de 1947, aos 91 anos. Parece que foi importante para ele ver o fim da guerra e garantir que o trabalho de sua vida ficasse a salvo.

O Dia Mundial dos Direitos do Consumidor é comemorado em 15 de março em homenagem à abertura da Selfridges.

O que você achou da história do Sr. Selfridge? Na sua cidade existem centros comerciais que adotaram as ideias deste grande homem de negócios? Conte para a gente na seção de comentários.

Comentários

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Nunca ouvi falar,mas deve ter sido um homem fenomenal. De personalidade marcante.

A matéria parecia desinteressante,mas prendeu minha atenção.

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