Uma história sobre o que se esconde dentro de todas as pessoas más

Histórias
há 3 anos

Isso acontece com todo mundo: mais cedo ou mais tarde, nos deparamos com pessoas, no mínimo, desagradáveis. Elas arruínam nosso estado emocional, nossos planos e podem criar situações dignas de qualquer vilão do cinema. Mas você já parou para pensar que talvez elas tenham um motivo para agir assim?

Para discutir esse assunto, o Incrível.club compartilha com você a assustadora história da russa Ksenia Veslinskaya sobre o fato de que vale a pena sermos mais atentos com as pessoas que nos rodeiam. Talvez assim, gente má simplesmente deixe de existir.

Tem uma sorveteria perto da nossa casa. Uma bem comum, cinza, sem nada que a faça se destacar das demais. Por alguma razão, eu nunca havia comprado nada lá, mas todo dia, quando saía para passear, meu filho e eu passávamos pela porta.

As férias são um momento maravilhoso. Especialmente porque temos tempo para perceber coisas que não notamos antes. De repente, comecei a notar que os fregueses daquela sorveteria, todos agindo do mesmo jeito, ao comprar um sorvete, em vez de ficarem cheios da endorfina em virtude de comer algo doce e gostoso, ficavam tomados por perplexidade e horror, como se tivessem visto um fantasma na pequena janela cinza.

Dois estudantes se aproximaram do local alegremente, passaram um bilhete amassado pela janela e apontaram com o dedo um sorvete, depois outro, depois outro, depois... Enfim, não conseguiam se decidir. De repente, a expressão facial deles mudou, pegaram os sorvetes passados através da janela e, com um olhar abatido, foram embora olhando para o chão.

Depois, uma senhora muito chique, usando chapéu e uma rosa vermelha no bolso do casaco, fez seu pedido pela janela, mas um minuto depois se foi visivelmente desconcertada, jogando o picolé que tinha recebido dentro da bolsa, como se fosse algo asqueroso. Confuso, seu rosto estava vermelho como a rosa do seu casaco, e seus olhos, cheios de lágrimas.

Minha curiosidade só aumentou, e eu resolvi experimentar todos os prazeres (ou desprazeres) oferecidos pela sorveteria. Afinal, o preço era baixo e, caso algum dano moral me fosse causado, eu me consolaria tomando o sorvete.

— Boa tarde!

Observo a penumbra da sorveteria, e vejo dentro do local os contornos de algo enorme mantendo um sombrio silêncio, como um vulcão adormecido.

— Por favor, eu quero um sorvete de creme.

O enorme vulcão despertava. Lentamente e de uma maneira ameaçadora, ela exalou de seus pulmões de fumante crônica uma resposta, quase sussurando:

— Você tem tssroco?

O vulcão, que usava uma jaqueta cinza, se aproximou da janela, e eu senti um calafrio percorrendo minhas costas, mesmo com os 28°C que faziam lá fora.

— O que você disse?

Ao fazer essa pergunta, sinto que já estou me arriscando, mas o risco parece necessário.

— Se você tem troco. Estou prestes a fechar para fazer um descanso, e não vou sair por aí tentando trocar seu dinheiro.

Das profundezas do vulcão, são lançadas maldições terríveis como se fossem lava. Algo sobre “a invasão dos idiotas”, “jovens sem jeito”, “descerebrados” e outras coisas que não podem ser reproduzidas aqui para não chocar as pessoas mais sensíveis.

— Sim, tenho dinheiro trocado.

Se há algo que tenho em abundância são moedas. Coloco o valor indicado em cima da bandeja e recebo o merecido sorvete. O vulcão hiberna novamente, murmurando algo para si mismo.

Pronto, o terrível segredo da sorveteria cinza tinha sido revelado. E já entendo os sentimentos dos clientes humilhados e insultados. Mas agora não penso em ir embora assim, sem mais.

— Você tem um emprego ótimo! — coloco nessa frase toda a alegria de que sou capaz.

— O quê? — o olhar por baixo das sobrancelhas era tão sombrio e pouco amigável que até engoli em seco. Mas não havia mais escapatória.

— Você tem um trabalho maravilhoso! Tenho até inveja. Você dá alegria às pessoas. Afinal, todo mundo adora sorvete. E você tem uma loja repleta deles! — continuo falando sem conseguir parar.

Em meio a um silêncio constrangedor, o vulcão executa operações complexas na própria mente. Ele está desconcertado. Em seu rosto enorme e sombrio, há traços de um esforço intelectual gigantesco.

— Você acha? — diz o vulcão, me fazendo notar uma pequena semente de interesse brotando.

— É claro! Seu trabalho é fantástico! E... você calcula tudo mentalmente, sem usar calculadora! — não me dou por vencida, aproveito minha oportunidade até o fim.

Uma longa pausa. O vulcão parece me perfurar com seus olhos profundos. Eu havia sorrido sincera e abertamente: sendo da área de humanas, eu, obviamente, admiro aqueles que são bons em exatas.

— Bem, eu já trabalho com isso há 30 anos, então não preciso de calculadora. Para mim, isso só complica tudo.

— É verdade — concordo. Você tem alguns minutos? E se eu e meu filho te convidarmos para tomar um sorvete? Vamos tomar um juntos, sentados ao sol? Tenho aqui algumas moedas, eu pago o seu.

Coloco um punhado do moedas no balcão e observo as feições do vulcão. Ele tinha se apagado, quase adormecido. A janela cinza fechou diante de mim. Parecia ser o fim.

De repente, vejo abrir uma porta lateral, e o maior vulcão do mundo aproximou-se de mim e do meu filho. Numa mão, levava um sorvete, e na outra, um jornal: “É para colocar no banco, que acabaram de pintar!”

Nos sentamos, tomamos sorvete e conversamos sobre tudo. A senhora T contou estar muito cansada e precisando de férias, que os filhos quase não levam seus netos para visitá-la e que ela sente muitas saudades deles. Disse que os preços estão subindo e que os salários não acompanham, e que muitos clientes não têm a menor educação. Falou ainda que, enquanto muita gente está sempre acompanhada, ela tem apenas um gato, um cachorro e um rádio.

— Mas senhora T, e quanto às pessoas que vêm vê-la todos os dias, vindo dos mais diferentes lugares? Elas não estão em busca de calorias, e sim de alegria! Você tem a companhia dessas pessoas, e eles, de certa forma, a sua. Afinal, sorrir já é suficiente para pessoas que não precisam ser desconhecidas, e sim verdadeiros amigas. É tudo tão simples e bonito! E o que dizer do céu? E do sol? E da temperatura agradável que está fazendo?

Meu filho corria à nossa volta quando, de repente, levou até ela uma flor que tinha colhido ali perto. O rosto da senhora T se iluminou, até suas rugas milenares se suavizaram. Ela ficou, não terei medo de dizer, muito comovida.

A pausa para o descanso acabou, nos despedimos e cada uma foi seguir com sua vida.

Um casal de idosos se aproximou da sorveteria. Pagaram, receberam seus sorvetes e, rindo como um casal de adolescentes, continuaram seu passeio.

Ilustradora Astkhik Rakimova exclusivo para Incrível.club

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