Uma história emocionante sobre a relação entre mãe e filha

Crianças
há 1 ano

Minha mãe adorava ver as janelas limpas. Janelas limpas e cortinas impecáveis.

Eu a entendo: uma janela transparente é uma ilusão de sua ausência e de conexão com a natureza. Como se aquela árvore estivesse bem perto, ao alcance da mão. E, se a janela está suja, funciona como uma lembrança de que se está separado do mundo exterior, onde há carros, fábricas e estabelecimentos comerciais.

Minha mãe adorava as janelas limpas, mas não gostava de limpá-las. Quando morávamos juntas, eu que limpava. Toda semana. No inverno, só pelo lado de dentro. Nas demais estações, por dentro e por fora. Minha mãe pedia que eu fizesse aquilo, e se eu não atendesse ao seu desejo, ficava ofendida. Chorava e tomava calmantes.

Os calmantes da minha mãe eram uma grande motivação. Eu limparia as janelas, apesar de odiar a tarefa. Mas odeio ainda mais o cheiro dos calmantes. Me chame de Cinderela Carmen. Carmen Borralheira.

Cansei de limpar janelas e me casei. Com alguém que não era obcecado por limpeza e que não se importava com janelas sujas. Em contraste com as janelas limpas da minha mãe, aquilo me pareceu muito atraente. Mudei da casa da minha mãe, passei a morar com meu marido no apartamento dele. Minha mãe tinha ataques de raiva, exigia minha volta, esperava que eu cansasse do papel de esposa. Eu ia vê-la com cada vez menos frequência. Porque cada visita era uma faxina. E quando eu estava cansada e não fazia a limpeza, precisava lidar com seus calmantes.

Eu logo tive um filho, e fiquei totalmente sem tempo para as janelas sujas dos outros.

Minha mãe se ofendia como sempre. E eu, como sempre, me justificava. A clássica codependência consciente da minha parte.
— Mãe, não posso viajar para outra cidade para limpar suas janelas. Tenho uma família, um filho pequeno, muitas coisas. Pagarei uma faxineira para que ela limpe suas janelas.
— Uma pessoa estranha? assustou-se ela.
— Sim, ela chegará, limpará e irá embora. É o trabalho dela.
— A pessoa vai chegar e perguntar: “Você é sozinha?” Eu direi: “Não, tenho uma filha”. A pessoa perguntará: “E por que ela não limpa suas janelas?” E eu vou morrer de vergonha.
— Você não vai morrer. Explique que você quer suas janelas limpas toda semana. E que sua filha mora em outra cidade e tem um bebê em fase de amamentação...
— Isso é horrível. Outras pessoas lavando minhas janelas, como se eu mesma não o fizesse.
— Mas você não limpa!
— Dei à luz. Alguém poderia limpar.
— Não, não posso.
— Não quer! E isso é muito vergonhoso.
— Mãe, tem uns dois meses que eu não limpo minhas próprias janelas. Talvez três. Não tenho tempo.
— E isso não te deixa envergonhada?
— Não. Tenho outras coisas igualmente importantes.
— Janelas são a alma de uma casa. Janelas limpas e comida boa. Se as janelas estão sujas...
— Sou uma péssima dona de casa, já aceitei isso.
— Simplesmente não sei a quem você puxou... Eu morreria de vergonha...

Eu me irritava. E desligava o telefone.

Tirar do sério e manipular são funções integradas na configuração básica da minha mãe. Ela adorava que tudo fosse do jeito dela, e quando lhe fosse mais conveniente. Parecia que ela não precisava de janelas limpas, e sim de janelas limpas por mim.

Uma vez, me pediu que eu levasse suas plantas para o sítio. Na terça-feira. Eu não podia na terça, poderia na quinta.
— Mãe, vamos na quinta, pode ser?
— Na quinta já estarei voltando. Preciso ir terça.
— Vou contratar um motorista. Pagarei para que ele a leve até lá.
— Um homem estranho? O que os vizinhos irão dizer? Dirão: “Cadê sua filha, por que ela não se preocupa com você?” Que vergonha.

Então eu entendi. Minha mãe não precisava ir ao sítio, precisava que eu a levasse até lá.
Eu me irritava. Resistia. Chorava. Pedia. Explicava. Desligava o telefone. Voltava a ligar. No final das contas, era minha mãe...

Levei alguns anos para entender que aquela “tirania” da minha mãe era, na verdade, seu desejo subconsciente de que ficássemos juntas, como uma maneira de compensar o fato de que, nos meus 30 anos de vida, só tínhamos morado juntas durante cinco anos.

Minha mãe não me criou, não teve tempo para aquilo. Mas agora tinha e queria me atrair até ela, mas agora quem não tinha tempo era eu. E é ótimo quando duas pessoas coincidem no tempo e nos interesses, em momentos que não podem ser adiados. Mas não se pode escolher o momento mais conveniente para criar uma filha; é preciso criá-la quando ela é pequena. Enquanto minha mãe procurava tempo para isso, eu cresci. Não precisava mais de uma mãe para me criar, aprendi a retirar o calor materno de outras fontes.

A geração das nossas mães, porém, não é propensa a refletir e admitir os próprios erros. Minha mãe queria que eu a pegasse no colo, queria estar perto, chamar minha atenção, mas simplesmente não conhecia outra forma de se comunicar que não fosse dando ultimatos.

Tomar consciência disso me amoleceu um pouco. Parei de me irritar, comecei a ler nas entrelinhas. Minha mãe inventava obrigações com o único propósito de me ver. E eu oferecia a ela a chance de me substituir com serviços de limpeza e motoristas contratados.

Para que ela ia querer gente estranha em sua vida? Ela queria a própria filha...

Passei a visitá-la com mais frequência. Levava meu filho e passava vários dias na casa da minha mãe, às vezes ficava a semana inteira.

Só que ela interpretou aquelas visitas de uma maneira diferente: achou que eu estava fugindo do meu marido, que nosso relacionamento estava ruim e que aquelas súbitas viagens podiam indicar um divórcio chegando.

— Você vai se divorciar?
— Mãe, que bobagem. Estamos bem.
— Bem, se não quer me contar, não conte.

A geração das nossas mães nunca erra, é claro.

A vida é um incrível bumerangue. Ela mesma fez justiça. Cresci na escassez de amor da minha mãe, e depois minha mãe viveu numa inconsciente falta do meu amor. A vida se divertia, orquestrando a situação de nossas próprias existências.

E então minha mãe ficou muito doente.

No começo, não achei que fosse algo sério, pensei que se tratasse de mais uma de suas manipulações. A manipulação envolvendo saúde é a mais eficaz. Garante que eu irei largar tudo a qualquer hora do dia ou da noite para ir correndo salvá-la. Só que, na verdade, ninguém precisava ser salvo. Ou talvez sim, só que não do pico de pressão, e sim de um ataque de falta de amor.

Uma vez fui vê-la no meio da noite, grávida, depois de ela ter me ligado dizendo que se sentia mal. Ela chorava ao telefone. Comecei a trocar de roupa, discuti com meu marido, que tentou impedir que eu fosse. Voei na estrada à noite, duas horas na velocidade máxima permitida, para chegar e ver minha mãe... dormindo tranquilamente.

Mas naquela vez a coisa era grave. Minha mãe ficou realmente doente, não conseguia caminhar sem apoio. Primeiro pediu um andador, depois passou a usar cadeira de rodas. E depois ficou de cama. Entendi que ela precisava de cuidado. Comecei a procurar uma enfermeira especializada. Mas o serviço era caro demais. E quanto mais pesado o paciente, maior o preço (porque era preciso levantar a pessoa, dar banho, etc.). O custo médio desse tipo de serviço, levando em conta o peso da minha mãe, era de 975 dólares por mês. Isso só pelo serviço. Havia ainda as fraldas, remédios, outros produtos... Somando tudo, chegava aos 1.500 dólares.

Porém, o maior problema que eu previ nem era o dinheiro. Era o fato de que um estranho cuidaria da minha mãe. Não eu.

Eu já imaginava as lágrimas no rosto da minha mãe, dizendo seu clássico “Vou morrer de vergonha”.
E os vizinhos, dizendo: “Mas você não tem uma filha?”

Tomei a decisão de me mudar para a casa da minha mãe. Junto com meu filho. Era o fim do verão, e eu matricularia meu filho no jardim de infância no mês seguinte. E cuidaria da minha mãe. Meu marido ficou atônito com minha decisão. Não o convidei para me acompanhar, pois sabia que ele não o faria. Ele morou sozinho desde os 14 anos, e comigo desde os 23. Tinha esquecido como é coexistir num território alheio. E o caso era de se mudar para a casa de outra pessoa, cheia de tapetes, cristais e infinitas manipulações...

— Viremos aos fins de semana — dizia eu, na tentativa de tranquilizá-lo. — Bem, pense que estou indo trabalhar. Trabalhar em troca de deixar de gastar 1.500 dólares por mês.

Meu marido achava que era uma péssima decisão. Ele estava até mesmo disposto a procurar um segundo emprego para poder pagar a enfermeira. E eu também poderia trabalhar, deixando nosso filho numa creche.

Eu não sabia como explicar ao meu marido que minha mãe não precisava de uma pessoa estranha. E ele não sabia me explicar que, mais uma vez, eu estava me entregando a uma manipulação.

Nos separamos no auge da incompreensão mútua. Família é apoio. E apoio é abrir um guarda-chuva no meio de uma tempestade para proteger alguém de quem você está com raiva. Mas, no fim das contas, não importa o quanto você está irritado: o amor é mais forte que todos os sentimentos negativos e que a incompreensão.

Eu estava sob a tempestade e não sentia o guarda-chuva de ninguém. Tinha apenas um guarda-chuva, e o abri sobre a cabeça da minha mãe, não sobre a do meu marido. Minha mãe precisava mais, estava doente. E eu tinha só uma mãe, não teria outra.

Aguentei por seis meses. Seis meses de inferno doméstico.
Eu, claramente, sou uma péssima enfermeira. Até porque não sou enfermeira.
Me faltava tolerância e aceitação. Não tinha sequer forças para não fazer uma cara feia quando ela cheirava mal, para disfarçar o nojo, para não me irritar com o fato de que eu mesma tinha escolhido aquele estilo de vida, e de que ninguém entendia minha escolha, que eu mesma também não conseguia entender.

Sim, eu cuidava da minha mãe da melhor maneira que podia: dava banho, trocava sua roupa, lavava seus pertences... Era difícil, mas necessário. Mas a cada segundo eu me sentia como uma pessoa presa numa armadilha de obrigações.

A situação piorava com o fato de que há tempos eu tinha me tornado mãe da minha mimada mãe. A dor a deixou irritada, cínica. Ela estava sempre descontente, com a testa franzida, me afastava dela, dizia coisas terríveis. Eu vivia numa névoa de negatividade.

E eu chorava constantemente, injustiçada. Gostaria de tirar uma fralda geriátrica suja e ouvir um “obrigada”, e não uma chuva de insultos pela minha falta de jeito para a tarefa.

Mais adiante eu entenderia o quão humilhante foi para minha mãe ficar inválida, com a insuportável sensação de ser um peso, a terrível sensação da velhice caindo sobre seus ombros, inclemente.

Aquela foi minha síndrome de Estocolmo pessoa: minha mãe havia me feito refém, me ofendia, me magoava, e quanto mais ela me insultava, mais pena eu sentia, mais temia por ela. Fui profundamente infeliz durante aqueles seis meses. Nos fins de semana, viajava e caía nos braços do meu marido, esperando doses de amor e diversão. Eram meus dias longe da velhice, da falta de esperança, do medo provocador por ver a vida de uma pessoa terminando de uma forma tão degradante como aquela.

Mas meu marido não queria ouvir minhas queixas nem sentir pena de ninguém. Queria curtir sua família, afinal foi para isso que ele a tinha constituído. Ele não entendia por que tinha de passar a semana como se fosse solteiro. E não conseguíamos reconstruir, em dois dias, aquilo que se desfazia durante a semana.

Resumindo, numa daquelas quintas-feiras eu me cansei. Olhei pela janela limpa e me dei conta: um pouco mais, e darei um passo através dela. Simplesmente não aguentava mais. Não podia fazer algo em que era ineficiente, fazer o que se esperava de mim, o que se considerava correto, mas que era uma tortura para todos nós.

Entrei no quarto da minha mãe acompanhada por uma mulher da minha idade, e disse:

— Mãe, esta é Natália, sua enfermeira.
— E você? — perguntou ela.
— Vou para minha casa — respondi.
E minha mãe começou a chorar. E eu comecei a chorar também.
Mas eram lágrimas diferentes.

Voltei para casa. Comecei a trabalhar. Para ganhar a vida ao lado do meu marido. Comecei a curar minha família machucada.

E minha mãe... minha mãe, de repente, rapidamente... começou a melhorar. Um mês depois, sentou-se na cadeira de rodas, depois voltou ao andador. Tudo praticamente sozinha.

A enfermeira era apenas uma profissional, sabia como diferenciar caprichos de necessidades, e ela mesma estabelecia as regras. Não lavou as janelas quando minha mãe quis.

Minha mãe percebeu que estava na companhia de outra mulher, que não caía em suas manipulações. E que a única forma de se livrar dela era mostrar que sua presença na casa era desnecessária. E para tanto, o único jeito era se recuperar.

Esta é uma boa história e uma experiência muito instrutiva, uma caixa completa com minhas ideias pessoais.

Sobre o fato de que as pessoas caem na rede das manipulações por vontade própria e por precisarem delas. Sobre o fato de que algumas dívidas devem ser pagas pessoalmente. Sobre o fato de que olhar através das janelas limpas é muito mais interessante quando elas mostram uma paisagem escolhida por você, e não pelas circunstâncias...

E sobre o fato de que só você decide qual a forma correta de amar a quem você ama.
E seus entes queridos têm o direito de fazer o que bem quiserem com seu amor.

E você... você, você! Você é quem deve determinar se suas janelas devem ficar limpas e escolher as janelas que emoldurem seus amanheceres e entardeceres.

Publicado com autorização da autora, Olga Saveleva.

Imagem de capa Depositphotos

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